“Língua Franca, a nossa língua portuguesa. Temos que dominar o mundo”. As palavras são do grande Senhor Caetano Veloso, a propósito deste novo disco de hip-hop.
Língua Franca mais não é que uma gigantesca ponte que une Portugal e o Brasil, pelas palavras e pela voz de quatro rappers: Capicua e Valete, do lado português; Rael e Emicida, do lado brasileiro.
As músicas e os músicos dos dois países sempre viveram de costas voltadas, com algumas honrosas e significativas excepções. Se a música brasileira sempre foi conhecida e consumida em Portugal, o contrário não é verdade. Nos últimos anos, porém, há vários exemplos de artistas portugueses com aceitação no Brasil, muitas vezes sob o patrocínio de grandes e consagrados músicos locais.
Agora o desafio é assumido. Quatro rappers, quatro estilos diferentes, uma língua. Sendo a língua a base e o pretexto, faz sentido que o hip-hop seja o veículo, o campo comum, a mesa à qual se sentam músicos dos dois lados do Atlântico.
Lisboa, a multicultural e mestiça capital portuguesa, foi a base do projecto, com uma residência artística de poucos dias que por aqui juntou os músicos e os produtores, entre eles Fred Ferreira, o homem que continua a estar em todas e sempre com classe e qualidade.
Os temas são os habituais no hip-hop: injustiça, política, luta, direitos humanos. Se os problemas são diferentes no Brasil e em Portugal há coisas que estão sempre lá, as ideias e as lutas universais.
A grande curiosidade deste disco é que este não é um disco de Capicua ou de Rael, ‘featuring’ os outros. Cada rapper desfila e intervém no seu próprio estilo, reforçando o discurso comum mas sem nunca perder a identidade.
Os brasileiros trazem mais melodia, mais ginga na voz, mas não podemos deixar de destacar aquele estilo ‘street’ de cabeça baixa de Valete, que está de volta com música nova.
Lisboa, São Paulo, Damaia, Porto, África. Um disco que tudo une.
Voltando a pegar em Caetano, nós não precisamos de dominar o mundo. Mas precisamos de estender as mãos a quem partilha connosco a língua e laços históricos inquebrantáveis. Este disco é um bom começo.