Homebound 456 é de uma fragilidade desarmante. Parece feito para nos tocar por dentro, para nos fazer recordar que é em nós que residem todas as inquietações, todos os suspiros, todos os desejos.
O que mais se cola aos ouvidos, mais ainda do que as canções de Homebound 456, é a delicadeza dos tons, das palavras, dos timbres que as moldam, dos acordes, de tudo o que se vai inspirando lentamente à medida que avançamos, passo a passo até ao derradeiro momento. Assim, aquilo que parece ser apenas mais um disco de indie-folk (faltando melhor designação, teremos de avançar com esta), não se resumirá a tão pouco. Vem-nos à cabeça a ideia de que há discos que parecem livros, e se aceitarem como boa esta possibilidade, então teremos aqui terreno fértil. Uma narradora (Margarida Falcão, a voz irmã de Catarina, quando ambas se apresentam como Golden Slumbers), e uma linha narrativa que percorre pequenas histórias, fragmentos, ideias espalhadas pelos onze temas do recente Homebound 456, primeiro longa duração do trio composto por Luís Monteiro, Ricardo Nagy e pela já referida Margarida. Mas há mais: uma certa noção de espaço sombrio, melancólico, rendilhado pelo som contaminante da voz feminina que nos guia por locais nítidos mas taciturnos e inquietantes. Depois, como que a finalizar a ideia iniciada, um ambiente intimista que lembra tempos distantes, a preto e branco, fotografias sonoras imprecisas, tremeluzentes, onde luz e sombra batalham tranquilamente pelo seu próprio espaço, embora não se perceba o que brilha mais, se o rasto de penumbra dos momentos mais luminosos, se a claridade porosa dos momentos mais cinzentos e contemplativos.
Homebound 456 é um disco de ambientes outonais, que assenta sobretudo na limpidez da voz de Margarida Falcão. É ela que sobressai, é ela que nos guia, é dela que parece tudo brotar. É também um disco de tom caseiro, um disco de lareira acesa, que apetece ouvir esfregando as mãos para que o frio sossegue e acalme as tremuras da alma. Ouvido agora, em início de uma primavera que vai parecendo reticente, parece ter, afinal, surgido em tempo próprio. As elegâncias de “I Never Leave, I Never Go”, “You” (o primeiro avanço do álbum) ou “Homebound 456” são apenas três exemplos do que vos fomos expondo. Talvez sejam essas as canções que melhor balizam e sintetizam a proposta dos Vaarwell, embora também nos pareça correta a ideia de que entre todas elas (as onze, e não apenas as três) exista uma linha que as une, que as percorre, um longo traçado imaginário e organizador da particular tecitura de Homebound 456.
Intimista por excelência, fazendo apelo a memórias chuvosas e outras outonais invernias, Homebound 456 é um primeiro passo largo de um caminho que se prevê profícuo. De todo este húmido elemento germinará, certamente, algo de fresco e bom.