Thurston Moore é um herói. No regresso a uma Lisboa que aprecia, e que muito o respeita, trouxe hora e meia de rock melódico e intempestivo. O costume, portanto – e a tradição aqui é sinal de vitalidade e excelência.
Não, não vamos falar dos Sonic Youth e das largas páginas de história rock escritas por Thurston na sua banda de sempre. Nem sequer vamos abordar os Chelsea Light Moving, que Thurston formou depois (e aos quais foi buscar o tema “Heaven Metal” para a atuação de quinta-feira em Lisboa). Vamos falar da banda que toca atualmente com Moore, e vamos falar do colosso sonoro trazido, em concreto, pelo parceiro de sempre Steve Shelley (bateria) e pelo baixo de Debbie Googe, ela própria parte definitiva da história do rock com os seus My Bloody Valentine.
Thurston entra em palco pouco depois das 23:00 de quinta-feira. O cenário é o Lux, em Lisboa, embora o concerto seja promovido pela Zé dos Bois – ainda não saiu qualquer som da guitarra e já o músico brinca com a plateia, sorri, sente-se em casa. Rock n Roll Consciousness, o disco deste ano, é tocado quase na íntegra. A casa está quase lotada e o público é maioritariamente dos 30 para cima – talvez o rock de Thurston não chegue a todas as gerações, mas a verdade é que há aqui uma sabedoria e mestria na arte de disparar pujança que deveria ser pelos mais jovens apreendida.
O grosso do espetáculo passa pelo rock encorpado, por guitarras em volume generoso e, aqui e ali, por doses de distorção e feedback. “Ono Soul”, a última das dez faixas apresentadas, data de 1995 e do primeiro álbum a solo de Moore, lançado ainda os Sonic Youth eram vida, e faz a súmula perfeita: é um tema melódico, que depois acelera, dá curvas e contracurvas, passa por minutos de explosão de ruído e volta ao começo – Thurston Moore e a sua mais que convincente e experiente banda gostam de baralhar e voltar a dar.
Muito haveria para dizer. Todos gostaríamos de ouvir faixas dos Sonic Youth ao vivo, mas Thurston Moore está nem aí – o disco deste ano é excelente e, por isso, o apreço em concerto das novas canções é o que motiva a viagem a prosseguir. O passado foi lá atrás, mas com repertório e músicos deste calibre, o futuro só pode ser encarado com um sorriso nos lábios.
Fotografia gentilmente cedida por Vera Marmelo