A banda de Wayne Coyne traz-nos um disco denso e intrincado, uma viagem lenta com ecos de kraut, isolamento e psicadelismo contido.
Os Flaming Lips são relativamente incaracterizáveis, o que é mais positivo do que negativo. Com uma carreira com já umas décadas em cima, têm-se mantido na percepção colectiva tanto pela música como, sobretudo, pelas tropelias do seu líder de sempre, Wayne Coyne.
Seja pelos seus espectáculos ao vivo cheios de cor, efeitos e bolas gigantes (com Coyne lá dentro, a passear sobre as cabeças do público), seja pela profunda amizade e cumplicidade forjada com a infame Miley Cyrus, os Lips nunca se foram efectivamente embora do palco mediático.
A euforia e a sede de viver de Coyne e seus comparsas pode constatar-se também na produção discográfica. O anterior álbum de originais, The Terror, era já de 2013, mas actividade não tem faltado. No ano seguinte foi editado With a Little Help From My Fwends, mais um dos tributos a grandes discos da história do rock, desta feita Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band, dos Beatles. As colaborações com Cyrus têm sido também abundantes, nem todas chegando a disco. Chega agora a hora de voltar ao curso normal da história, um disco novo.
E não é uma loucura daquelas despachadas. Para uma banda conhecida pela sua esquizofrenia produtiva, este novo Oczy Mlody (olhos dos jovens, em polaco) é um trabalho surpreendentemente focado. O imaginário é o mesmo de outras aventuras: o psicadelismo, o espaço, a exploração. Mas, agora, temos perante nós um disco mais lento e mais calmo do que o habitual, uma espécie de distopia futurista em que o som é moderno, mais electrónico e menos rock.
O ritmo é baixo, exploratório, com os temas a desenrolarem-se lentamente à nossa frente. As influências kraut são inegáveis, sobretudo ao nível do ritmo quase drone de muitas das músicas. Os temas são carregados de camadas e texturas, que aparecem, desaparecem e se sobrepõem, revelando um intenso trabalho de estúdio.
Mas aqui o lugar não é o do entusiasmo pelo futuro. O tom é muitas vezes sombrio, isolado, o canto de um inocente perante um mundo desabitado.
É difícil destacar uma música, porque Oczy Mlody é um todo; desenhado e pensado para ser consumido dessa forma. Até “We A Famly”, dueto de Coyne com Cyrus alegadamente proveniente de outras sessões que não a deste álbum, acaba por fazer todo o sentido no conjunto dos temas. Essa coerência acaba, paradoxalmente, por penalizar o disco, sendo difícil distinguir uma música da outra. Faltam singles, falta uma ou duas grandes canções, e isso transforma o que poderia ser um belo disco num disco apenas interessante.
Oczy Mlody é, ainda assim, um disco sério, profundo e misterioso. Uma aventura feita de um kraut minimal tingido de tons ácidos. Uma viagem, sim, mas que ganharia com maior diversidade na composição.