Chegou 2014. E com ele, o muito esperado álbum de estreia da banda de rock psicadélica britânica, os Temples. O projecto – formado por James Edward Bagshaw, Thomas Edison Warmsley, Sam Toms e Adam Smiths – já desde 2012 que tinha vindo a namoriscar cautelosamente com o panorama musical alternativo, virando cabeças e conquistando ouvidos com o seu som retro, que lembra uns Beatles por alturas do excelente Revolver cruzados com uns Tame Impala depois de umas férias num outro planeta, evidente em singles como “Shelter Song”, “Colours to Life” e “Mesmerize”. E chega agora, com o ano novo, o primeiro álbum saído fresquinho do laboratório destes estranhos seres pertencentes a outras épocas e mundos, Sun Structures.
Sun Structures sabe a acordar de um sonho de dois dias com a cama desfeita e sem uma meia, o que não significa necessariamente que o estado pós-audição se assemelhe ao estado pós-sonho: embora algo enevoada, a memória, pelo menos da aura fantasmagórica e psicadélica do álbum não se desprende tão rapidamente de quem o ouve. Ao longo de doze faixas, os Temples erguem uma poderosa muralha de som que tanto pode pertencer ao século seguinte como ao século passado. As referências quase diretas a influências de companheiros psicadélicos fazem-se sentir, sendo os mais óbvios os grandes mestres na técnica – aqueles Lennon/Mccartney numa época na qual o seu não completo estado de sobriedade permitiu alguns verdadeiros rasgos de genialidade como “Tomorrow Never Knows” e “She Said She Said” – mas também contemporâneos como Tame Impala, Pond e os também britânicos Toy. No entanto, mesmo pegando numa fórmula que já foi mastigada e cuspida vezes sem conta, os Temples conseguem apropriar-se dos elementos certos para conseguirem edificar uma sonoridade própria.
O riff inicial de “Shelter Song”, os versos entoados em coro, os pratos a ressoar distantes, fazem o ouvinte torcer o nariz com a possibilidade de ser ainda outra banda a mastigar e a cuspir a tal velha fórmula: é só esperar até ao refrão, que vem diretamente de um sonho profundo e cativante. O sonho prolonga-se ao longo das doze faixas, cada uma mais psicadélica, numa mixórdia de velho e novo que quando resulta, resulta bem demais para se acordar. “Sun Structures” é energética, com um riff cheio de força e de anos sessenta. “The Golden Throne” encontra o seu encanto numa melodia que parece saída do tema de um vilão de desenho animado mas que estranhamente funciona num álbum de indie rock psicadélico. Sabe-se lá porquê. “Keep In The Dark” é simples, podendo mesmo faltar-lhe um ingrediente qualquer mas que nem se nota ao engolir, assim que entra apropriadamente a voz de viagem a aconselhar “dream on and sleep…”. “Move With The Dark” é fantasmagoricamente fluída, bebe-se como água. “Sand Dance” é bizarra, destorcida, desviada e deliciosamente estranha ao ouvido, tropeçando e caindo nos próprios contratempos (quem conhece psicadelismo lá saberá). “Fragment’s Light” chega na hora de acordar com fome de sair da cama. Com uma guitarra e uma aura que lembra quase uns Genesis no seu auge, não se assemelha a nada deste mundo ou arredores.
Não é um álbum perfeito. Está longe de se conseguir desprender completamente das suas influências, às quais muitas vezes pode parecer agarrar-se de mais. No entanto, tem a quantidade arrebatadora de carisma embrenhado numa nostalgia de tempos melhores necessária para mostrar que 2014 será um bom ano para os Temples. Pode não ser o ano deles mas será com eles, de certeza. O John Lennon dispensa agradecimentos; os meninos estão por conta própria. Obrigada, Temples.