Os nossos terroristas sonoros preferidos estão de volta e não podiam vir em melhor/pior altura. Os britânicos estão ainda em choque com o Brexit: os mais civilizados porque não queriam sair, os outros porque, em boa parte, também não queriam sair, mas cederam ao medo e à xenofobia tão bem trabalhada pelos conservadores, com a ajuda do irresponsável e desastrado David Cameron. Enquanto isso, Trump choca o mundo tornando-se presidente dos EUA e Putin vai brincando à Terceira Guerra Mundial. O mundo está um lugar estranho e perigoso.
Os Sleaford Mods sempre fizeram a política a base da sua mensagem. Não uma mensagem partidária, mas uma forma de ver os grandes temas de baixo, junto do povo a que pertencem, entre um trabalho lixado durante a semana e uma bebedeira acelerada no pub, à sexta-feira. E isso volta agora a suceder, embora de forma algo diferente.
Depois de terem furado o bloqueio mediático com Austerity Dogs, de 2013, e terem explodido com Divide and Exit do ano seguinte, os Sleaford Mods dão-nos agora a sua sexta edição de originais no mesmo número de anos. Desta feita é um EP, cinco músicas, 17 minutos, e de alguma forma o formato serve bem os seus propósitos. A fórmula minimalista do duo pode ser redutora, e a diferença entre os temas pode perder-se em registos mais longos.
Na análise ao anterior Key Markets, deixávamos a questão sobre se os Sleaford Mods conseguiriam dar o salto musical que os libertasse das limitações da sua génese: uma cama instrumental repetitiva, normalmente com um baixo intenso mas nem sempre, e com a voz irada de James Williamson a cuspir a sua poesia das ruas contra tudo e contra todos. Ouvindo este novíssimo TCR, a resposta tem de ser negativa. Se o disco anterior arriscava um pouco musicalmente, aqui o risco é zero. A estrutura é a mesma dos discos antigos, com os Sleaford Mods a demonstrarem um monumental desprezo pelo facto de terem assinado pela maior Rough Trade Records e poderem, se quisessem, fazer um disco mais complexo, mais completo, mais tradicional, mais cheio. E nem o facto de Iggy Pop ter dito recentemente que os rapazes são “absolutamente, sem dúvida e definitivamente a melhor banda de rock n’ roll do mundo” lhes subiu à cabeça. Até porque aqui, de rock, só a atitude.
A verdade é que, se isso acontecesse, talvez se perdesse a magia destes dois rufias de Nottingham. Os seus trunfos são fazer o que ninguém faz, estarem-se perfeitamente a cagar para o facto de aquilo ser um portátil, uma caixinha de ritmos barata e um desvairado a falar por cima de tudo. A sua energia e a sua mensagem sempre foram o essencial, e os rapazes não iam mudar isso agora.
O tema mais forte acaba por ser mesmo “TCR”, que abre o disco, revelando mais uma vez Williamson, o extraordinário contador de histórias e poeta do quotidiano da classe baixa britânica. Aqui, grita que “I hate going out, going out is for young people”, num conto de uma saída à noite fugindo das responsabilidades da idade adulta. É, curiosamente, também o tema mais mexido e musicalmente mais rico do EP, que nas restantes “canções” não consegue escapar da mediania instrumental que impede mais altos voos desta banda (se eles o quisessem, do que tenho sérias dúvidas).
TCR acaba, na verdade, por ser mais do mesmo. As histórias de Williamson continuam magníficas e inigualáveis (e difíceis de entender na totalidade para quem não nasceu nas ruas de Nottingham), e isso nunca pode ser mau. Mas não deixa de ser verdade que a fórmula que lhes deu a força é também uma prisão da qual não sabem ou não querem libertar-se.