Em 1980 Bruce Springsteen lança o seu trabalho mais completo (e mais amadurecido) no sentido da explosão total e absoluta de criatividade. Um trabalho duplo com múltiplos temas e variações e um nível de qualidade a roçar a perfeição. The River funcionou como a entrada do jovem rebelde na vida adulta bem de referência identitária de toda uma obra que se iria construir a partir dali. Está tudo em The River desde as influências aos temas até ao universo de um rapaz crescido no tecido suburbano de New Jersey no meio de uma classe operária ora contente com a sua rotina ora desesperada com as reviravoltas da economia.
Para celebrar os 35 anos da edição de The River Springsteen lançou The Ties That Bind: The River Collection , uma caixa onde ao duplo álbum completo se juntam alguns registos não aproveitados nas sessões de gravação. Alguns deles acabam por “saltar” nos concertos brindando o público com esse acto de intimidade.
The River Tour 2016 marca a primeira digressão de concertos em dois anos para Springsteen e a” E Street Band” antes de o Boss voltar para o estúdio e desenvolver um projecto a solo como planeado. Como já foi dito atrás trata-se de uma tournée comemorativa que traz consigo logo à partida como cartão de visita a execução integral do duplo álbum. A média de duração dos espectáculos tem oscilado entre três horas ou três horas e meia. Uma comemoração que tem implícito um ritual quase sagrado dedicado aos fiéis de um criador e de um momento mágico em particular da sua obra.
A digressão em apoio da edição comemorativa dos 35 anos de The River foi uma ideia inesperada numa altura em que Springsteen estava envolvido nos primeiros passos de um novo projecto a solo. A primeira ideia de promoção do produtor Jon Landau teria sido uma série de pequenos espectáculos em Nova Iorque e Los Angeles, sugestão com que o Boss não concordou na medida em que os trabalhos preparatórios e os ensaios iriam demorar demasiado tempo. Portanto o melhor seria fazer cerca de 20 espectáculos.
Max Weinberg, o baterista, disse que recebeu uma chamada de Springsteen uma semana antes da tour ser anunciada. “ Em todos os meus compromissos profissionais há uma cláusula que se repete. Chama-se “um acto de Deus” ou de Bruce Springsteen. É inviolável e anula todo e qualquer compromisso feito até aí. Mas não é só Weinberg que deixa para trás tudo o que está a fazer. Nils Lofgren (guitarra) viu-se obrigado a alterar datas na sua digressão a solo enquanto Gary Tallent (baixo) simplesmente adiou todos os seus compromissos.
A representação integral do álbum é figura central de todos os concertos. Ao contrário da última vez que Springsteen e a E Street Band tocaram em Portugal, este ano haverá diferenças. Se por um lado a digressão se torna muito mais curta do que a anterior por outro vamos encontrar uma secção de metais muito mais reduzida.
“ Sabia que a base do espectáculo seria The River e isso significava um pequeno grupo de Rock. O alinhamento de músicos muito mais apertado devolve-nos o espírito daqueles tempos” disse Springsteen numa entrevista. Por outro lado também não vamos contar com a presença de Patti Scialfa (casada com Bruce desde 1991 e com três filhos) que estará a acompanhar as provas equestres de uma das filhas.
A digressão original de The River começou em Outubro de 1980 e continuou até Setembro de 1981 com concertos a durarem quatro horas ao longo de 140 datas. Uma primeira confirmação de Springsteen e da sua banda de artistas especializados em maratonas musicais, reputação que só se veio a reforçar com o passar dos anos.
A tour teve o seu arranque em Pittsburgh em 16 de Janeiro deste ano. Até agora os concertos têm começado com “Meet Me In The City” seguido pelo álbum integral de The River rematado com um set de mais 12 canções da parte não aproveitada há 35 anos. O concerto fecha com um cover do clássico dos Isley Brothers, “Shout”.
Temos portanto à nossa frente um espectáculo de qualidade garantida, uma cerimónia de comemoração, uma liturgia para os fãs, um ritual extenso e inesquecível mesmo para os que não estão muito familiarizados com o trabalho de Bruce Springsteen e da sua” E Street Band”. Uma noite inesquecível será garantida.