Estou na dúvida se o facto de não ter gostado muito de Peter Murphy ontem no Coliseu de Lisboa teve a ver com a prestação em si ou se por ter visto dois espectáculos monumentais uns dias antes (Nick Cave no Primavera Sound de Barcelona e Dead Can Dance no Coliseu). Na verdade pareço ser a única a ter reticências em relação ao concerto, porque estava tudo eufórico e mais que rendido. Mas houve ali qualquer coisa de inexplicável que não bateu certo, a mim pelo menos, e que aqui vou tentar explicar.
Antes de mais, convém dizer que a actuação de Peter Murphy não era um simples concerto, mas sim a celebração dos 35 anos dos Bauhaus e como tal, o alinhamento seria composto apenas por temas da banda que Murphy liderou no final da década de 70 e no início dos 80. Houve algumas surpresas, mas a isso já lá vamos. E depois, convém também avisar que cheguei meia hora atrasada e que perdi umas oito canções, mas como nestas coisas as estrelas se costumam alinhar para mim, pouco depois de aterrar, esbaforida, num Coliseu muito abafado e cheio de fumo, fui presenteada com a “Strange Kind Of Love”, uma das tais excepções uma vez que se trata de um tema de Peter Murphy e não de Bauhaus.
A coisa continuou ainda melhor com “Bela Lugosi’s Dead”, talvez o tema mais conhecido dos Bauhaus e um dos mais intensos, mas que ontem não teve metade da intensidade que esperava, depois seguiu-se “The Passion of Lovers” e “She’s In Parties” e foi a sequencia quase perfeita, não fosse tudo ser feito a correr, sem espaço para respirar entre canções. Aliás, todo o concerto foi assim.
É verdade que os Bauhaus são uma banda do pós-punk e que Peter Murphy, acompanhado ou a solo, veste o personagem do excesso, do excêntrico que se contorce e se move de forma errática, mas ontem tudo isso pareceu pouco genuíno. Murphy estava, sim, demasiado acelerado para conseguir transmitir a calma e a intensidade que os Bauhaus e a sua sonoridade pedem. Além de que parecia demasiado preocupado em gerir tudo o que se passava à sua volta, desde guardar o microfone no bolso do casaco para poder fingir que tinha asas aos pedidos à equipa de roadies para arranjar os microfones, levar as guitarras ou tirar as teclas. Ok que foi tudo feito em silêncio, mas a constante correria de elementos estranhos à banda em cima do palco tornou-se uma distracção do concerto em si que, ainda por cima, não tinha qualquer elemento acessório.
Não havia um ecrã com imagens nem qualquer aparato cénico em cima do palco, apenas os músicos e um jogo de luzes simples, soturno e intimista, que foi, aliás, uma das coisas boas que o concerto teve porque dava a sensação de estarmos num qualquer concerto dos anos 90, que vive da música e da banda e de nada mais.
Tentei agarrar-me a isso e aos temas que ouvia há uns 20 anos, mas foi difícil com a rapidez do que se passava em cima do palco. Quando dei por mim já o concerto se estava a aproximar do fim, a julgar pela setlist dos concertos anteriores. Severance, uma versão dos Dead Can Dance, encerra a atuação propriamente dita e abre espaço ao encore que já se previa nessas setlists.
“Burning From The Inside” e “Cool Cool Breeze”, só com voz, antecedem um dos momentos mais altos da noite quando na guitarra soam os primeiros acordes de “Ziggy Stardust”, de David Bowie. Já com um casaco diferente, Peter Murphy e os seus jovens músicos despedem-se, mas ainda voltam para um segundo – e inesperado encore. Tocam “Spirit” e Murphy avisa: “E agora vamos embora”, mas não sem antes tocarem mais uma versão, desta vez dos Joy Division. Foi ao som de “Transmision” que Peter Murphy fechou a celebração dos 35 anos dos Bauhaus e não deixa de ser curioso que, apesar de toda a euforia, os temas que não são dele tenham sido dos mais aplaudidos.
(Fotos: Duarte Pinto Coelho)














