
Quando os dias começam a ficar mais escuros e a chuva cai com mais frequência é sinal de que os grandes concertos estão de regresso à Galeria Zé dos Bois, em Lisboa. No último dia 28 de Outubro, essa profecia voltou a ser cumprida mal Jessica e Cyrus pisaram o palco desta bonita casa. Escondida atrás de um cabelo amarelo-quase-branco, Jessica cumprimentou o público – Cyrus quase nem olhou para ele – e, antes de pegar na guitarra, brincou com a famosa montra da ZDB “É estranho ser o alvo de window shopping”. As pessoas que enchiam a sala sorriram e esperaram pelos primeiros acordes.
Com uma tranquilidade feliz, as primeiras músicas foram-se soltando dos dedilhares suaves de Jessica e os mais metálicos de Cyrus, também ele semioculto atrás do cabelo que lhe dava pelos ombros. Sem pressas, todos fomos levados por um embalo muito doce, uma luz muito calma, que nascia das trocas de dedos simples dos dois artistas que têm percorrido a Europa em tourneé. O calor que normalmente se associa à casa onde uns dias depois a Space Lady iria actuar sentia-se, mas não asfixiava, como às vezes acontece. Com algum espanto, dissipava-se na música de manta e chuva que se ia ouvindo – “Night Faces”, “Wrong Hand” ou “On Your Own Love Again”, por exemplo. Sempre introspectiva e de voz nasalada, Jessica cantou durante uma hora e pouco. Quando o concerto acabou, depois de dois encores (um deles a solo) que pareciam sempre que se iam multiplicar em mais dois e, depois desses, mais outros dois, via-se na cara de quem lá tinha estado que um bom concerto tinha chegado ao fim.
“Nunca me senti tão calmo na vida” disse um rapaz barbudo no átrio da galeria, enquanto esperava que a Jessica lhe assinasse o bilhete. A declaração, salvo algum do exagero característico de quem atingiu a maioridade há pouco tempo, tinha muito de verdade. O caminho a pé de regresso a casa foi mais leve, as subidas foram menos inclinadas, o vento foi menos castigador e o sono muito mais descansado.
Fotos gentilmente cedidas por Vera Marmelo