Aos 75 anos, Paul Simon ainda se sente capaz de dar mais um passo importante e decisivo na construção de uma obra que todos sabemos avaliar como ímpar. Stranger To Stranger é , de certo modo, um regresso ao passado, mas inclui ingredientes que apontam caminhos para um futuro que ainda terá muito para dar.
O homem nascido em Queens há muito que é king do folk rock norte americano. Já nos deu de tudo, e tudo o que nos deu foi do melhor. Com ou sem Garfunkel ao lado, a verdade é que Paul Simon foi garantindo o seu lugar de grande destaque na história da (boa) música anglo-saxónica, por isso é sempre com satisfação que ouvimos um qualquer novo trabalho de Paul Frederic Simon, o pequeno gigante que trouxe ao mundo clássicos como “Mrs. Robinson”, “Still Crazy After All These Years” ou “The Boy In The Bubble”. Mas os tempos são agora outros, e Paul Simon sabe que as consagrações passadas não garantem vitórias futuras, pelo que teve de se fazer ao caminho, e durante cerca de cinco anos andou a gravar Stranger To Stranger, disco relativamente curto (não chega a ter 40 minutos de duração), mas certeiro quanto baste para o colocarmos ao lado de Graceland ou The Rhythm Of The Saints, até porque retira deles, mas sobretudo do álbum de 1986, alguns dos predicados que imortalizaram esses dois tremendos trabalhos. Não se entenda, no entanto, que este seu mais recente disco anda ombro a ombro com as duas referidas obras primas, mas verdade seja dita que há já algum tempo que o pequeno génio não nos oferecia um longa duração tão bom.
O grande trunfo de Stranger To Stranger é a sua linguagem regionalista. Parece claro que as escolhas de certos instrumentos de percussão e de cordas voltam a ser decisivos na afirmação sonora do novo álbum de Paul Simon. Não esquecendo o hand-clapping de origem flamenca, claro, mas também o cajón (instrumento/ património da nação peruana) e o ektara, muito usado na música tradicional feita na Índia ou no Paquistão, por exemplo. Basta ouvir com atenção os segundos iniciais de “The Werewolf” para avaliarmos o território que por aqui se pisa. Esse novo som, digamos assim, junta-se ao modo falado / cantado tão típico Paul Simon e ao seu enredoso estilo melódico habitual. Depois, como tantas vezes acontece com os seus discos, as grandes canções parecem surgir a cada passo, e em Stranger To Stranger há um bom lote delas. Os maiores exemplos serão “Wristband”, a faixa que dá título ao álbum (imensa, redentora, em que o músico canta o sugestivo verso “It’s just a way of dealing with my joy” repetidamente), “Proof Of Love” e “Insomniac’s Lullaby”. Só “Street Angel” nos parece um pouco aquém das restantes 10 canções, duas das quais são mais vinhetas do que qualquer outra coisa (“The Clock” e “In The Garden of Edie”), embora ocupem um espaço importante de respiração, digamos assim, por entre alguma da turbulência rítmica e palavrosa que o álbum encerra.
Stranger To Stranger ganha by far aos anteriores So Beautiful or So What (2011), Surprise (2006) ou You’re The One (2000), os seus discos de originais deste século. Isto, convenhamos, quer já dizer alguma coisa. E sai vencedor, sobretudo, por se situar e cimentar nesse já conhecido espaço que medeia um passado de aventuras rítmicas e melódicas muito bem sucedido, e um caminho igualmente rítmico e melódico que acrescenta novos sabores do mundo ao mundo poético e musical de Paul Simon. Até porque os discos de Simon não são feitos apenas para serem ouvidos. Ler aquilo que escreve é também um trunfo inestimável. Por tudo isto, julgamos que Stranger To Stranger é um dos maiores álbuns de 2016!