De Linda Perhacs a Rodriguez, o mundo da música está cheio de injustiças. Gente que devia ter sido, no seu adequado tempo, muito maiores do que foram, muito mais aplaudidos, muito mais famosos. Que deviam, por via desse sucesso, ter tido o incentivo para fazerem mais música, para nosso deleite.
Ned Doheny (quem?!) é um desses casos. Confesso que eu próprio não o conhecia até há pouco tempo, quando um dos camaradas do Altamont mandou a sugestão deste Separate Oceans para cima da mesa. Parti para a escuta do disco sem grande expectativa, até porque a horrenda capa (parece uma coisa de banda fatela dos anos 90) a isso ajudou. Mas é deixar a rodela girar e o resto deixa de interessar; e, musicalmente, este Ned Doheny (quem?!) tem que se lhe diga.
Doheny fez parte da cena do Sul da Califórnia no final dos anos 60, início dos anos 70, dos Eagles, de Laurel Canyon, dos cowboys movidos a cocaína. Chegou a ser a primeira contratação da Asylum Records, pela qual lançou o primeiro disco, homónimo, aos 22 anos. Sem sucesso. Não sendo um artista country nem sendo um hippie, fazia um som mais aberto, mais inclusivo, muito mais comercial que os seus companheiros de editora Joni Mitchell ou Graham Nash. Estranhamente, nunca conseguiu vender grande coisa, talvez por a editora não saber bem como o promover, apesar do look de ‘pretty boy’ e das suas inegáveis qualidades de composição e interpretação. Lançou mais dois discos pela Asylum, e depois desapareceu. No final da década de 70, ruma ao Japão, onde se tornou mais famoso que nos EUA, acabando por investir boa parte da sua carreira nesse mercado, até bem dentro dos anos 90. O seu último disco, que mais uma vez passou despercebido, é The Darkness Beyond The Fire, de 2011.
Então que raio é este Separate Oceans, e como se atreve este cota a vir importunar-nos em pleno ano da graça de 2014? Simples: é uma espécie de best-of da carreira de Ned Doheny nos anos 70, o seu melhor e mais fértil período. Entre os hits que nunca foram hits e algumas versões demo, temos aqui uma cápsula do sol da Califórnia, drogas e technicolor e tudo, no formato de 19 faixas.
O som é magnífico e dispara numa série de referências. Estamos perante boa pop, formato canções, que junta Supertramp, Stevie Wonder, Eagles, Motown, pré-disco e Fleetwood Mac fase Rumours. Estamos em terrenos soft-rock, sim, mas com um bom gosto impecável, um swing inegável e estranhamente negro, melodias para dar e vender, num disco ‘feel-good’ que promete derreter o Verão com este ‘beach-funk’ tramado.
Confusos? Pois.
Ignorem a capa feiosa e o nome artístico digno de um contabilista: sigam para o disco.
Ouçam-me “Each time you pray”, por exemplo, a segunda faixa deste álbum. Se isso não vos der vontade de meter os pés na areia e abanar a anca ao estilo dos 70’s, então nada mais podemos fazer por vocês.