Aos mais cépticos incomodavam as aparentes limitações musicais e o seu jogo seguro, aquela mesma combinação de arranjos, letras e voz; já por terras de sua majestade, Home Again levava o selo BBC’s Sound of 2012 e a nomeação para o UK Mercury Prize (que acabou por escapar para os Alt-J). Críticas à parte, uma coisa era certa: aos 25 anos e apenas com o álbum de estreia debaixo do braço, Michael Kiwanuka entrou para a história da música, do (bluesy) folk e da soul.
Mas foram precisas quatro primaveras inteiras para, de repente quando já quase todos nos esquecíamos dele, um novo single de Kiwanuka invadir as rádios e os streamings do planeta. “Black Man in a White World” conquistou com o seu afrobeat viciante, ao mesmo tempo que a voz negra do britânico, filho de ugandeses, se envolve naquele bate-palmas-em-contratempo à antiga, que vai crescendo em coros, cordas e batuques. Quatro anos depois, Love & Hate prometia e, já com 29 anos, Michael Kiwanuka aparecia mais confiante de sua música.
Nos entretantos, soube-se que Michael Kiwanuka abandonou a meio a colaboração para Yeezus (2013) de Kanye West. Segundo o britânico, porque se sentia perdido, “senti-me estúpido ali sentado, eu e a minha guitarra acústica, com todos aqueles produtores e rappers”, esclareceu à London Evening Standard (Maio 2016). Em vez disso, juntou-se a Danger Mouse, o “produtor da moda” e de bandas como U2, Red Hot Chili Peppers ou Ce Lo Green, e o que tinha tudo para descambar em algo mais artificial e sem alma, afinal espelha evolução e no sentido certo. Sim, em Love & Hate ouve-se uma composição bem mais arrojada, com canções mais robustas e arranjos mais orquestrados, mas a identidade de Kiwanuka está toda lá, nas letras que declama e na nostalgia da sua interpretação. Em equipa vencedora não se mexe? Não necessariamente. Mas é preciso coragem.
Começar um disco com “Cold Little Heart” é mais do que uma afirmação ou opção estética. São 10 minutos de canção – a melhor de Love & Hate – sem pressa de se revelar, mas que nos chega a fazer pele de galinha. E se o álbum começa em grande, a fechá-lo podemos escutar “The Final Frame”, uma simples e quase básica canção, que ganha vida com um simples e sexy solo de guitarra. Pelo meio, Michael Kiwanuka serve-nos pequenas refeições para a alma, que tanto servem de confronto – “Love & Hate”, “Place I Belong” – como constituem objecto de reflexão – “I’ll Never Love”, “Rule The World”.
Ao mesmo tempo que percorremos Love & Hate, nomes como Otis Redding, Curtis Mayfield ou Marvin Gaye invadem-nos o pensamento. Michael Kiwanuka bebeu de todos esses deuses para sonhar com o seu momento. Há quem diga que ainda falta para lá chegar. Prefiro dizer que já faltou mais…