Já não se fazem bandas como antigamente. Sendo assim, gosto de pensar que hoje em dia se fazem bandas como os LCD Soundsystem, e nada mais evidencia a possibilidade do grupo norte-americano liderado pelo carismático vocalista, multi-instrumentalista e produtor James Murphy ser o sinal de uma grande mudança como a sua despedida bizarra do mundo da música.
Para um fã devoto, ver a sua banda preferida terminar transborda de vários níveis de trauma; por um lado, a surpresa, pois costuma acontecer de forma abrupta e imprevisível, e por outro, a perspectiva de que nunca terá a oportunidade de se despedir desta apropriadamente. Os LCD Soundsystem terminaram – e no entanto conseguiram desviar-se o máximo possível da faceta traumática que o ato proporcionaria. O projecto não viu o seu fim devido a qualquer acontecimento trágico mas sim a um desejo quase estupidamente simples; o desejo de parar de fazer música. E ainda mais, proporcionaram aos fãs uma oportunidade de despedida, num estrondoso concerto no Madison Square Garden. Escolhida para caracterizar todo o processo foi a ideia de que “se isto é um funeral, vamos fazer o melhor funeral de sempre”.
Deixam um legado de três discos, LCD Soundsystem, de 2005, Sound Of Silver, de 2007, e por fim, This Is Happening, de 2010.
Talvez fosse mais sensato começar por tentar classificar que género de ruído é que os LCD Soundsystem produziram enquanto existentes. No entanto, a realidade é que a sua formação também deve carecer de um qualquer elemento das bandas de antigamente, ou seja, a conformidade a um estilo único. Assemelham-se a uma espécie de dance-punk revival que lembra ao longe Talking Heads ou New Order. No entanto, em This Is Happening, James Murphy e companhia parecem como que abandonar as suas tendências punk de outrora e debruçar-se mais do que nunca sobre a pista de dança, tecendo cuidadosamente nove faixas, a maior parte delas de grande duração, que se erguem ao longo de vários minutos, antes de tombarem, exaustas, sobre si mesmas.
Em This Is Happening, os LCD Soundsystem vêm-se evoluir consideravelmente, adquirindo um som mais maturo e completo. O disco vê-se começar pela deliciosa “Dance Yrself Clean”, que começa tímida e minimalista, até se ver levada por uma onda de sintetizadores que impelem a melodia inicial gloriosamente. Outros pontos altos do disco incluem “Drunk Girls”, a música mais “comercial” (devido à sua curta duração), “All I Want”, uma música de amor que transborda doçura na simplicidade do seu riff (talvez até tenha na sua simplicidade um encanto semelhante a uma distante “New York, I Love You But You’re Bringing Me Down”) e a exuberantemente alegre última faixa, “Home”. No entanto, o estrelato pertence de facto a uma enorme “I Can Change” – uma melodia aparentemente básica e com uma letra que chega a ser caricatamente amadora, mas que se vê ensaboada pela produção aguçada de Murphy, culminando numa arrebatadora explosão de sintetizadores e ritmos que dificilmente vão abandonar a memória do ouvinte.
Apesar de algumas faixas serem apenas demasiado longas e se verem estranguladas pela sua própria construção delicada e possivelmente tediosa, como “Somebody’s Calling Me”, This Is Happening é, sem dúvida, um disco que não deixará ninguém com dois ouvidos indiferente, até porque o empenho e trabalho com o qual foi elaborado é quase palpável, tornando as suas poucas falhas algo enternecedoras. Não é, porém, um disco imediato; as músicas surgem sem pressa e vão fazendo o seu percurso lentamente, parando aqui, ali, demorando-se o tempo que for preciso, o que não irá surtir o mesmo efeito em todos os ouvintes. Não obstante, é uma experiência completamente diferente de tudo o resto.
Em “I Can Change”, Murphy propõe inocentemente “dance with me until I feel alright”. Todo o This Is Happening ergue-se sobre uma construção de um cenário de funeral-discoteca apocalíptico, no qual criaturas dançantes desconhecidas e anónimas se balançam na pista de dança, deixando as suas lamúrias do dia-a-dia verem-se afogadas nos sintetizadores e batuques que inspiram um bem-estar inexplicável. É caso para dizer; “Se isto é um funeral, vamos fazer o melhor funeral de sempre”. Por agora, resta-nos esperar que This Is Happening não seja um adeus definitivo mas sim um até à próxima a James Murphy e companhia.