O “hiato” acabou – os King Gizzard trazem-nos um álbum “americanizado” e mostram que ainda têm uns quantos truques na manga.
A grande seca acabou finalmente. Depois de nos mimarem com o ritmo frenético a que lançaram os cinco longa-duração de 2017, os King Gizzard fizeram de 2018 um ano sabático para recuperar as forças e a inspiração. Os sintomas de privação não demoraram a manifestar-se. Irritação, tremores, alucinações auditivas que incluíam solos de harmónica e riffs dilacerantes e, pior de tudo, a criação de expectativas que podiam não ser correspondidas.
Estamos com sorte. Fishing for Fishies representa uma tentativa “falhada” de fazer um disco de blues. Segundo a banda, as canções lutavam para serem enquadradas nessa roupagem musical e o grupo decidiu deixá-las correr o seu curso. O blues elétrico de “Boogieman Sam” e “The Cruel Millennial” (a primeira com Creedence Clearwater Revival no seu pedigree, a segunda com um slide guitar que mostra que a banda ainda tem muitos truques na manga) parece confirmar esta história. A primeira metade do disco pode ser considerado um mini-álbum no qual o grupo conseguiu cumprir o seu objetivo.
“Fishing for Fishies”, que começa o álbum, é uma deliciosa pepita folk com algumas das harmonias mais açucaradas com as quais o grupo já nos presenteou. O arranjo inclui ainda uma harmónica e ocasionais interjeições de guitarra elétrica que impedem que a música se torne repetitiva ao longo dos seus cinco minutos. O R&B Motown-iano de “Plastic Boogie” conta com uns coros bastante fiéis ao material de origem, assim como barulho de fundo, simulando uma performance descontraída num qualquer bar de beira da estrada num sábado à noite. Depois de passarem a maior parte da carreira a beberem da fonte do krautrock, é refrescante ver o grupo buscar inspiração noutras geografias, resultando no disco mais “americanizado” do grupo.
Chegado à segunda metade, o disco descarrila repentinamente (no melhor sentido possível). “Acarine” em particular começa de uma forma banal, até se dissolver à medida os arpejos de sintetizador começam caminhar para outra dimensão… e uma secção techno bofeteia, com uma traquinice quase infantil, o ouvinte mais preparado
“Cyboogie” causou alguma controvérsia aquando do seu lançamento, com muito fãs a afirmarem que a banda se tinha vendido (talvez ignorando que a música tem uma duração de quase sete minutos). Uma pérola synth pop com vocais filtrados por um vocoder, “Cyboogie” peca apenas pela sua repetição dando um final estranho a um disco com poucos passos em falso.