Titubeia lôbrega e contida, entrelaça-se juntamente com as melodias das cordas, tão intensa quanto breve, tão empedernida quanto visceral; a reminiscência canta pela voz de Courtney, branda como se lhe permite, e, de frondosa melancolia, melancolírica. A reminiscência queda-se por aqui, não deserta, e Days é a sensação epitomal de remembrance, aquela persistente que se acompanha amargamente da impossibilidade de se recuperar mais do que a memória: “Wonder years pass me by / Far away but still on the mind”; porém, “Ya ha pasado el tiempo / Hay que aceptarlo.” Devendra, em Mala, congratula-se pela semelhança memorialística, pelo pendor decadentista do outrora, amálgama cálida, eterno retorno, uma valsa profusamente dançada com o olhar, o vestido rouge a esvoaçar, rosto abrindo-se num sorriso lânguido. Talvez o “mi amor” de que fala em “Mi Negrita” seja não mais do que uma personificação tal de vulto esse varrendo os cantos da memória: “Mi amor no tiene esperanza / Aunque te esperará”; “Este viejo no se cansa / Siempre te perseguirá”. “Wonder Years” diz que “I’m not ok but I guess I’m doing fine”, e porquanto tal mais é do que uma recordação decadente da recordação: esta persegue, mas está arrumada, adocicada pela fermentação da memória, e estamos bem. Possivelmente é mais doce do que hoje, mas estamos bem. Real Estate olham o horizonte contemplativamente; eventualmente viram costas, cruzam um sorriso cúmplice, e o sol nasce.
Canção do Dia: Wonder Years – Real Estate

Diogo Montenegro
Diogo de nome, Montenegro como apelido, intencionalmente confundido por «pontonegro» ou «montepreto» de forma recorrente, teve como maior arrependimento a sua inscrição no IST em 2013; assim, como recompensa, um miminho egoísta, gesticulou um manguito para o prezado instituto, e como maneira de viver engoliu cursos de revisão literária à boca rota e escreveu críticas e reportagens com maior parcimónia no ano lectivo transacto. É inferível portanto, que se passe a vulgaridade, que é um «ser de muitas contradições»: além do ódio a clichés, candidatou-se neste ano escolar a Artes e Humanidades na FLUL e dá explicações de matemática. (Curioso.) É ainda apologista do acordo ortográfico de 1945. Que o ecletismo não se gaste tão cedo. Nem a boa música.