Renato Russo foi o maior poeta do rock brasileiro. As suas letras são, por vezes, de um enorme e cortante realismo. Em “A Via Láctea”, canção escrita quando o cantor da banda Legião Urbana já se encontrava bastante enfermo, essa marca de realidade lírica cruza-se com os seus sentimentos mais íntimos, uma vez que a canção revela o estado de alma de quem a compôs. Sentido a morte cada vez mais viva em si, Renato Russo canta “Hoje a tristeza não é passageira / Hoje fiquei com febre a tarde inteira / E quando chegar a noite / Cada estrela parecerá uma lágrima”. Na verdade, a dor pode ser uma coisa artisticamente bela, e “A Via Láctea” prova-nos isso da maneira mais comovente possível.
* Renato Russo faleceu de SIDA no dia 11 de outubro de 1996
Show amigo. Entendo a música como lamentação. Uma mistura de sentimentos de dor e angústia. Uma multiplicidade de interpretações pode ser retirada dessa linda música. Febre pode ser interpretado como um estado de agitação, de perturbações talvez até de pensamentos e lembranças quem tenham sido trazidos a tona pelo repouso imposto pela doença. E o sentimento de solidão que o assola nesse momento tão delicado da vida.
Com o perdão da palavra, discordo de você, Carlos.
E Como amante que sou das poesias musicadas de Renato Russo, deixe-me compartilhar só um aspecto dos vários que vejo nessa canção e que creio ter sido o motivador também de Renato para compô-la.
Apesar da dor da enfermidade que o assolava, Renato vai mais longe e capta o íntimo da dor da existência humana. Somos imperfeitos, limitados, miseráveis, e mesmo com todo o avanço da humanidade na ciência, seremos sempre esses seres pequenos perdidos em algum recôndito de nossa galáxia. A tragédia humana repousa no seu nada, ainda que quase sempre se pretenda muita coisa. Renato entende enfim que não somos grande coisa e isso é trágico.
A “febre” na música nunca entendi como a febre causada pela doença que o acometia, mas sim a sensação que uma febre qualquer provoca: fraqueza, vulnerabilidade. O ser humano é frágil e é tolo quando pensa que não o seja.