O auge da popularidade da nova pop britânica, assente em guitarras e que até certo momento nos anos 90 até funcionou como uma refrescante resposta ao grunge e da invasão das tabelas de vendas por bandas americanas, encontra um dos seus momentos de maior relevo e até de projecção mediática, num disputa que opôs os Blur e os Oasis.
O Reino Unido sempre foi muito proteccionista em relação à música e desde os anos 60 tinha uma posição de liderança global, impondo as regras do rock e da pop.
Mas no universo do rock independente e mais alternativo, as regras ficaram de cabeça para baixo com o extraordinário sucesso de Nevermind dos Nirvana. De súbito as grandes editoras disputavam as bandas americanas, de Seattle e não só, que se movimentavam no underground, dando-lhes uma visibilidade que nunca antes o rock alternativo vivera, tornando-se mainstream.
A resposta britânica ao movimento do Grunge de Seattle e que mexeu nas regras do mercado para sempre foi precisamente com bandas de guitarras. Os sintetizadores da New Wave passaram ao passado e o presente fazia-se com pop é certo, mas com guitarras, cruzando diferentes referências dos últimos anos do rock britânico, desde o pós-punk ou passando pela explosão recente da cena Madchester.
Com a morte de Kurt Cobain em 1994, o rock alternativo britânico pôde finalmente dar o salto e tomar as rédeas da carruagem, voltando a ditar parte das regras.
Nesse mesmo ano, os Blur tornam-se na maior banda britânica, fruto do sucesso de Parklife. Mas os Oasis respondem pouco depois com o primeiro disco Definitely Maybe, que se torna na época, o álbum de estreia que mais rapidamente vendeu, ultrapassando o feito histórico dos Suede.
Com inúmeras bandas novas a surgirem na mesma altura e com enorme sucesso comercial, os meios de comunicação social, os jornais de música e os locutores de rádio, começaram a usar o termo Britpop. E do ponto de vista de um britânico era um termo perfeito, pois dava uma identidade muito própria aos novos grupos, que não emulavam o que chegava da América, pelo contrário, tinham uma forte identidade britânica. Tinham como raízes a pop dos 60’s, cantavam com sotaque das ilhas sem ter receio em o esconder e relatavam histórias ou episódios tipicamente britânicos.
Mas o momento em que o termo Britpop se torna de facto popular, explodindo de forma massificada por todos os meios de comunicação social, acontece quando os Blur decidem editar um novo single na mesma data que iria sair também o novo single dos Oasis.
As duas bandas já demonstravam uma certa rivalidade, principalmente pelas diferenças sociais e geográficas. Os Blur eram uma espécie de meninos do sul, de Londres, de classe média e bem comportados. Do norte, de Manchester, vinham os Oasis, da classe operária, que batalharam arduamente para conseguir chegar onde chegaram e que não tinham vergonha de ser um pouco rufias.
Foi a editora dos Blur, a Food Records, que tomou a decisão de antecipar a edição de “Country House”, single de avanço para The Great Escape. Dessa forma, o lançamento do tema iria coincidir com “Roll With It”, o primeiro single para o segundo disco dos Oasis (What’s The Story) Morning Glory?. As duas músicas iriam ser colocadas à venda no dia 14 de Agosto de 1995.
E se já havia alguma rivalidade entre os dois grupos, esta decisão que no fundo iria disputar o primeiro lugar da tabela de singles, despoletou uma atenção mediática nunca antes vivida no Reino Unido.
A imprensa de música apelidou o confronto como “The Battle of Britpop”, a batalha da britpop. Mas rapidamente, a luta pelo primeiro lugar do top, chamou também os restantes meios de comunicação, jornais, rádios e televisões. E até à edição dos dois singles, era frequente haver alguma notícia sobre os Blur ou Oasis nos telejornais ingleses, com reportagens a dar conta do confronto e seu impacto na indústria.
A batalha cativou a imaginação do público, que começou a escolher o lado da barricada: Norte ou Sul, classe operária ou classe média, Damon Albarn ou Noel Gallagher, Blur ou Oasis?
As diferenças regionais passaram a ser tão importantes como a música e os tablóides ingleses fizeram o máximo para espremer todo o género de notícias que representassem esse facto. Qualquer palavra dita por elementos dos grupos era tomada em consideração e a tudo poderia ser atribuído uma espécie de insulto em relação à outra banda. Era a febre da Britpop, numa semana que mexeu com as fundações da música popular das ilhas britânicas.
Finalmente quando os single foram editados, os Blur foram consagrados vitoriosos, vendendo 274 mil cópias contra as 216 mil dos Oasis. A batalha da Britpop tinha sido ganha pelos londrinos. No entanto, os irmãos Gallagher preparam-se para rir por último, quando os respectivos álbuns foram editados.
Apesar de “Country House” entrar para número 1 no mês de Setembro, em Outubro os Oasis quebraram todos os recordes com (What’s The Story) Morning Glory?, que permaneceu 10 semanas no primeiro lugar do top inglês, superando por completo todas as vendas dos Blur. Além de terem um dos discos que mais vendeu em toda a história da pop britânica, os Oasis conseguiram dar o salto para os Estados Unidos, também neste ponto, ultrapassando as pretensões dos Blur. Os irmãos Gallagher perderam a batalha, mas no fim, ganharam a guerra.
Por outro lado, os Blur repensaram a sua música e quando regressaram em 1997 com o homónimo Blur, negaram a pop orelhuda em prol de um som mais pesado e experimental. E desde então, os Blur afirmaram-se como um dos grupos saídos da Britpop que mais desafiou as convenções do formato canções, com resultados verdadeiramente excepcionais.
Com os Blur a afastarem-se da Britpop e com o terceiro disco dos Oasis Be Here Now a desapontar em termos críticos, o género musical que aglomerava tantas bandas começou a definhar e as atenções viraram-se para grupos com uma estética sónica menos convencional e não tão abertamente pop, como por exemplo os Radiohead.
No entanto, nunca mais a música britânica viveu um período tão vibrante como a batalha da britpop, um episódio que saltou para lá da música, envolvendo toda a sociedade da época e que se projectou, de alguma forma ou outra, em duas bandas que fizeram história: Blur e Oasis.