Os First Breath After Coma são uma das revelações da música portuguesa. Surgiram em 2012 e apareceram em 2013 nos Novos Talentos FNAC, lançaram o primeiro disco em Novembro do ano passado, e a recepção tem sido boa. Entrevistámo-los neste Verão no Fusing Culture Experience, em Agosto, para falar sobre a sua história, o momento que vivem e os planos para o futuro.
Altamont: Fusing, Paredes de Coura, Bons Sons… era este o percurso que idealizavam? Chegaram onde queriam?
Roberto Caetano: Sim. Quando começámos, quando nos juntámos todos, lembro-me de que, nas primeiras entrevistas que demos, dizíamos que o nosso objectivo era chegar ao Paredes de Coura. Era o festival em que mais queríamos tocar até hoje… o percurso que fomos tendo até agora, pá, tem sido excelente fazer parte destes festivais. Tem sido uma aventura espectacular.
Surpreende-vos já terem conseguido alcançar esse grande objectivo?
Telmo Soares: Acaba por surpreender… nós já tocamos desde, sei lá, os 13, 14 anos, e sempre fomos aqueles garotos ingénuos. Epá, claro, sonhávamos, sonhávamos, mas lá no fundo nunca acreditámos que chegaríamos aqui. Depois, quando surgiu este projecto mais sério, as coisas começaram a ficar…
Rui Gaspar: Começámos a perceber que era possível. Víamos isto como um objectivo muito distante. Mas passado um tempo, e com o projecto a evoluir, as coisas foram avançando naturalmente, e quando chegámos à altura dos festivais já não foi aquela surpresa que poderia ter sido. Se nos tivessem dito há dois anos que íamos chegar aqui, não acreditaríamos.
Vocês começaram mais pelos territórios post-punk e aproximaram-se entretanto um pouco mais do post-rock. Era o caminho planeado ou foi surgindo com o tempo?
Rui Gaspar: O post-rock… foi mesmo do nada.
Roberto Caetano: O post-punk foi mais na altura em que nós fazíamos covers e quando dávamos os primeiros passos, foram essas as influências e foram bons alicerces para aquilo que queríamos fazer a seguir. As influências se calhar eram demasiado óbvias, e ainda não tinha surgido aquele som de que andávamos à procura, não estávamos satisfeitos com isso, e foi aí que o post-rock caiu em cima de nós de repente.
Acham que o post-rock em Portugal neste momento está de boa saúde?
Rui Gaspar: Em termos de bandas, sim. Tens os Allstar Project de Leiria, da nossa cidade, que para nós é um colosso de Portugal e mesmo da Europa. Mas não tem tanta «saída» como talvez devesse ter. Há várias bandas de post-rock… nós, se calhar é mais fácil chegarmos ao público porque também temos voz e o formato das canções não é post-rock puro… portanto, a nossa música não é só post-rock.
Sentem-se pioneiros da cena em Portugal?
Rui Gaspar: Só não nos sentimos pioneiros por causa dos Allstar Project… [risos]
Telmo Soares: Allstar Project é uma das melhores bandas portuguesas de post-rock…
Roberto Caetano: Portuguesas?
Telmo Soares: Portuguesas… Mundiais! [risos]
Então sentem-se também influenciados pela cena de Leiria, não?
Telmo Soares: Sim, mas nós somos uns meninos ao lado deles…
Rui Gaspar: Isto também porque nós não gostamos de rotular a nossa música como post-rock… nós vimos do post-punk, ouvimos de tudo, temos voz, o formato das canções não é post-rock… pá, temos essa influência, mas temos muito mais coisas que acabam por não ser ditas.
Telmo Soares: Usámos o post-rock como influência parcial, foi basicamente isso que fizemos. Incluímos voz, usámos o lado progressivo do post-rock.
Rui Gaspar: E a atmosfera…
Telmo Soares: E a atmosfera, mas depois inserimos outros elementos exteriores, temos influências de todo o tipo.
Também vos apontam muito os Explosions in the Sky como influência. É uma das vossas bandas tutelares?
Telmo Soares: Nós ouvimos muita coisa… cada um ouve um leque variado de música diferente. Os Explosions foram o primeiro contacto que tivemos com o post-rock. Quando estávamos a analisar todo o trabalho deles, houve essa música, «First Breath after Coma», que ligava perfeitamente com o sentimento, não tanto do post-rock, mas da banda em si.
Rui Gaspar: Era um novo começo também para nós.
Telmo Soares: Somos capazes de estar um dia virados para ouvir hip-hop…
Rui Gaspar: Valete…
Telmo Soares: Às vezes ouvimos jazz misturado com hip-hop. Outras vezes ouvimos electrónica. Pá, de tudo um pouco, e acho que ultimamente temos ouvido cada vez mais coisas diferentes e isso acaba por influenciar.
Relativamente ao vosso disco, The Misadventures of Anthony Knivett, é um disco conceptual. Onde é que se inspiraram para criar o conceito em causa?
Roberto Caetano: Nós, quando estávamos a criar o nosso primeiro álbum, queríamos um conceito, e entre nós tentámos perceber para onde é que a nossa música nos levava, que sentimentos tínhamos ao ouvir e ao tocar a nossa música. Sempre imaginámos um escafandro, aqueles fatos de mergulho antigos, pela ideia que temos da música enquanto estado de submersão, de estarmos lá em baixo, vivos ao mesmo tempo, mas alheios de tudo. Foi na pesquisa sobre escafandros que tropeçámos no Anthony Knivett e descobrimos uma história imensa por trás, que passa por um corsário inglês, feito escravo e libertado várias vezes no Brasil, e, numa dessas viagens, a mando de portugueses, enquanto escravo, foi obrigado a ir ao fundo do mar com um escafandro e quase morreu. Acabou por ser libertado, e quando voltou a Inglaterra escreveu um livro — The Misadventures of Anthony Knivett — com relatos sobre o Brasil. Foi o primeiro a retratar a costa brasileira. Foi uma ideia engraçada e acho que correu bem.
E planeiam manter-se fiéis a esta linha de pegar numa ideia ou num acontecimento e fazer um disco a partir dele?
Rui Gaspar: Para nós, todo o disco, do início ao fim, tem de ter um fio condutor, um sentido. A atmosfera do disco e a própria música, os sentimentos que provoca. Se o próximo disco tem de ter uma história, uma personagem ou um conceito tão limitado quanto o do primeiro, não sei. Pode ser mais abstracto, se calhar. Ainda não sabemos.
E como é que acompanhavam a audição de um disco destes?
Telmo Soares: Para aí à lareira, e em contacto com a natureza era o ideal.
Rui Gaspar: Boas paisagens… temos também vários amigos nossos que ouvem o disco enquanto estudam.
Roberto Caetano: E tiram todos de 18 para cima.
Rui Gaspar: Fica aqui o apelo a todos os estudantes.
Telmo Soares: Damos explicações, nós.
Falando em concertos, qual foi o mais memorável que tiveram até agora?
Roberto Caetano: Infelizmente, até agora [Agosto] não se proporcionou, ainda não tivemos nenhum sentido que conjugasse um grande concerto e um grande público, a mistura dos dois.
Rui Gaspar: Sim, um palco grande, com muita gente… O mais importante talvez tenha sido a estreia do álbum, em Leiria. Foi no teatro Miguel Franco e marcou o início de tudo. Foi o primeiro dia do nosso CD, tivemo-lo na mão… Acho que nunca vamos ter um concerto que marque como aquele. Teremos outros que marcarão de maneira diferente.
Entrevista: Gonçalo Correia e Alexandre Malhado
Fotos: Alexandre Malhado