“Não é um disco conceptual, é mais um teatro de revista.” Na passada quarta-feira, viajámos a bordo de uma mesa da Louie Louie numa conversa curiosa com três dos cinco Capitães da Areia, que, apresentando agora o seu mais recente trabalho, Uma Viagem a Bordo do Apolo 70, expressam um desejo sério de não serem levados demasiado a sério. Tudo entre piadas, bom gosto e boas conversas.
Altamont: Este vosso novo disco tem sido extremamente bem recebido pela crítica e pelo público, conseguindo até uma valente aprovação da parte de Nuno Markl – imaginamos que tenha sido uma grande honra. Já esperavam este género de reação a um disco que acaba por ser algo bastante diferente do que estamos habituados a ouvir?
Pedro de Tróia: Não foi uma surpresa, mas também não estávamos à espera de nada. Podíamos estar à espera da pior reação como da melhor reação. Honestamente, somos indiferentes – na medida em que só queremos que as pessoas oiçam o disco e conheçam a banda.
Tiago Brito: A melhor reação é sempre não passar despercebido. Podem até falar mal. Mas não incomodar em nenhum sentido, tanto no bom sentido ou no mau…
António Moura: … É o pior.
Então é mais numa de “qualquer publicidade é boa publicidade.”
TB: Sim, só não nos podem dar é três estrelas. Três estrelas é o número proibido.
Este novo trabalho, Uma Viagem a Bordo do Apolo 70, é de facto um disco muito pouco usual – um disco com mais faixas do que estamos habituados, com um vasto leque de convidados, e, claro, que conta uma história de uma viagem pelo espaço que se assemelha a um filme de ficção científica. Tem sido chamado um disco conceptual…
PDT: … Mas pode não ser um disco conceptual. (Risos) Para nós não é.
Então e porquê?
PDT: Não há um conceito claro. Um disco conceptual tem de se formar em torno de um conceito, acho eu. Mas conseguimos perceber como é que passa por um disco conceptual, na medida em que é um disco diferente dos outros – é um disco que se tem de ouvir do princípio até ao fim…
… Reúne todos os atributos de um disco conceptual.
PDT: Isso claro que conseguimos perceber, mas se nos perguntarem se a ideia foi fazer um disco conceptual… Lamento dizer que não, porque isto foi tudo um acaso. Foi um acidente de trabalho. (Risos)
AM: Sim, um acidente de trabalho. (Risos)
Então, como é que se deu esse acidente de trabalho?
PDT: Isto tudo surgiu a partir do momento em que o Tiago [Brito] começou a criar uns instrumentais e mostrou-nos – na altura, estávamos ainda a lançar o primeiro disco [O Verão Eterno d’Os Capitães da Areia] portanto em 2011, e começámos um bocado a criar coisas em cima disso. E a ter ideias, e mais ideias, e mais ideias… Este disco surgiu por isso mesmo de todas as ideias que fomos tendo e concretizando. Por isso é que demorou o tempo que demorou…
TB: E em termos logísticos, também, a gestão dos convidados…
PDT: E fazer a capa, também… Portanto, não nos veio uma grande ideia assim de repente – íamos tendo pequenas ideias e juntando as coisas.
TB: Quando se fala de discos conceptuais, costuma-se dizer; “ah, este é uma crítica social, este é não sei o quê…” Há discos conceptuais que são muito mais do que isso – mas nós não, fomos fazendo e depois pensámos, “há quem vá chamar a isto um disco conceptual…” Simplesmente, não nos levamos suficientemente a sério para chamar aquilo um disco conceptual.
O cunho de disco conceptual é algo que, em retrospetiva, gostariam de poder ter evitado?
TB: Não queremos equívocos, mas não nos incomoda.
Foi só o tal acidente.
PDT: Sim, por exemplo; estamos em casa e vemos uma crítica a falar de um certo “duelo de uma geração pop-rock” entre os Capitães da Areia e os Capitão Fausto… E já agora, porque é que não gravamos uma música com eles? Depois, estamos a descer umas escadas e alguém manda uma piada do Bruno Aleixo, e pensamos… Vamos convidar o Bruno Aleixo para gravar connosco.
Além dessa tal participação surpreendente de Bruno Aleixo, contam também com várias outras dignas de menção, entre elas José Cid – que já tem sido ligado com este vosso novo trabalho, visto que ele próprio, em 1978, lançou a sua própria espécie de disco “espacial”, 10,000 Anos Depois Entre Vénus e Marte. Consideram o trabalho de José Cid algum tipo de influência no vosso trabalho?
PDT: Por acaso, foi um disco que só ouvimos pela primeira vez há cerca de dois anos.
TB: Acho que começámos a dar mais importância a esse disco quando nos foi dito que o nosso tinha alguma coisa dali. Ou seja, nós não fomos ouvir esse disco e depois…
… Não foi propositado.
TB: A participação de José Cid no nosso disco remete para aquela questão de brincar com as referências… Como tanta gente começou a notar semelhanças entre o nosso trabalho e o dele, chamámo-lo para fazer uma piada fácil, mas uma referência obrigatória ao 10,000 Anos […]. Também nos foi dito que tínhamos alguma coisa dos Heróis do Mar, ou que éramos os novos Heróis do Mar, por isso chamámos os Heróis do Mar…
Por isso, ninguém está lá por acaso. Aliás, olhando para a capa, vê-se o que pode ser uma referência à capa do Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band [álbum dos Beatles de 1967]. Pode ser só coincidência…
TB: … Não é coincidência, foi mesmo intencional. Nós agarrámos nesta ideia de fazer uma espécie de Sgt. Pepper’s […] porque acaba por ser uma ideia recorrente, na linguagem pop – é uma coisa iconoclasta… Também não somos os primeiros a fazer um género de homenagem a esta capa, já houve muitos outros.
Voltando agora aos convidados; mesmo parecendo que já conseguiram chamar quase toda a gente que poderiam ter chamado, há mais alguma figura, portuguesa ou não, com a qual gostariam de colaborar num projeto destes no futuro?
PDT: Assim o único que não quis colaborar connosco foi o Bruno Morgado, visto que não pode. Era alguém que gostaríamos de ter convidado, mas não deu… E gostávamos de um dia, se possível, contar com ele.
Já têm agendado para o próximo dia 21 de Fevereiro, Sábado à noite, um concerto de apresentação do disco no Musicbox. O que podemos esperar?
PDT: Nós já temos tocado alguns dos temas novos ao vivo nos últimos concertos, para não ficarmos enferrujados, mas vai ser a primeira vez que os tocamos no âmbito do lançamento do álbum…
TB: Sim, mas o concerto não vai ser uma cópia na íntegra do disco. Não vai ser uma ópera, ao vivo.
… Não o consideram um disco conceptual, mas portanto, talvez seja mais uma ópera rock?
TB: (Risos) Não, nós consideramos mais o nosso disco um teatro de revista do que uma ópera.
PDT: Uma vez perguntaram-nos como é que íamos apresentar esta ópera ao vivo… (Risos). Mas pronto… Nem tudo é tão fácil. Não vai ser possível convidar pessoas, nem nada desse género.
Pergunta final; com a chegada das confirmações da época de festivais – e tendo em conta a vossa passagem pelos Bons Sons, no ano passado – há planos ou vontade de passar em algum lado este próximo verão?
PDT: Ainda não há planos, mas há muita vontade.
TB: Seja festival, concerto… O que nós queremos é tocar.
Fotos: Francisco Fidalgo