Continuamos a antevisão do Magafest 2016, com entrevistas a alguns dos músicos que passam por lá. Hoje trazemos Alexandre Rendeiro, um dos pontas-de-lança da nova geração de músicos nacionais. Vai editar no final de Setembro o álbum de estreia, Mirror Lane, mas não vamos precisar de esperar tanto para conhecer esse disco. Já no dia 10, no Palácio Sinel de Cordes, Alek Rein vai estrear uma boa parte das canções novas.
Antes de mais, quero saber da tua identidade. Alek Rein é um heterónimo?
No início, Alek Rein era só uma variação do meu nome, Alexandre Rendeiro, mas depois à medida que fui escrevendo mais canções, fui vendo que o imaginário dele era bastante diferente do meu, ou que as coisas que ele vivia eram bastante diferentes das minhas, e o Syd Barrett, numa canção que é a “Jugband Blues” – que é das últimas que ele escreveu com os Pink Floyd, há lá uma parte em que ele diz “I’m wondering who could be writing this song”, e isso fez-me eco na cabeça, “quem é que poderia estar a escrever esta canção?”. Então eu comecei mesmo a assumir que o Alek Rein era uma personagem distinta, passou de alter-ego para heterónimo. O alter-ego é uma variação da mesma pessoa, o heterónimo é uma pessoa com uma biografia diferente, com características diferentes.
Então o Alek Rein tem uma vida própria. Gostas mais da dele ou da tua?
É complicado. Gosto das duas.
Lançaste o teu primeiro EP há 6 anos e em breve vai sair o teu primeiro álbum, Mirror Lane. O que podemos esperar desse disco?
Acho que há canções que são da mesma linhagem, talvez, há coisas que já se separam daquela estética… Mas de sonoridade, de produção, é mesmo bastante diferente. Agora o cânone, mesmo da canção rock, pop-rock, folk, não sei se se desvia muito do EP. Mas a estética é diferente.
Desse disco, já conhecemos o single “River of Doom”. O resto do disco também segue essa inspiração da folk de costelas norte-americanas?
Eu tento ser fiel àquilo que curto mesmo ouvir. Eu faço música – até ouvir uma frase do Ariel Pink – não sabia bem porquê, mas quando ouvi ele a dizer, ou li numa entrevista, em que ele dizia que fazia as canções que gostava que passassem na rádio, para ele um dia ligar a rádio e estar a dar aquela malha. E quando eu ouvi isso fez todo o sentido, é assim que eu faço canções, quero ouvir essa cena na rádio.
De que forma é que este single representa o resto do disco?
Eu acho que esta é a mais canónica, mais ortodoxa, a sequência entre verso, refrão, ponte, é toda muito clássica. Por isso, na altura em que estávamos a pensar que single havíamos de lançar, esse foi um dos argumentos a favor da “River of Doom”, por ser a mais certinha de composição. No resto do álbum, há umas que também são mais ortodoxas mas depois eu gosto de viajar um bocado e levar o ouvinte a mundos menos organizados, menos previsíveis de estrutura.
Tu escreves letras em inglês, porque te é natural, vai melhor com este tipo de música, o português não entra na tua escrita?
Eu nasci nos Estados Unidos, vivi lá até aos 7 anos, ainda fui à escola, se calhar ajuda um bocado neste aspecto, é mais natural escrever em inglês. Não sei, é um bocado unha e carne, o inglês e este tipo de música, mas confesso que me desafio a tentar escrever em português e é muito complicado para mim, é um bocado alienígena este tipo de música com português em cima. Mas eu tento, eu vivo aqui e gostava de tentar comunicar mais directamente, com o inglês há sempre… não sei, parece que enfeitiça um bocadinho, as pessoas ouvem e só à 5ª ou 6ª vez é que começam a prestar atenção à letra.
Por outro lado, ao cantares em inglês abre mais facilmente as portas para exportares a tua música. Tens isso em mente?
Sim, tenho noção que pode vir a calhar, pode dar jeito. Um dos meus objectivos era dar uma tour grande pela Europa e nesse aspecto, vai ser fixe cantar em inglês, acho eu. Já tenho pessoal com quem trabalhar e organizar isso, já é um bom passo.
No dia 10 de Setembro vais tocar no Magafefst, já vais mostrar boa parte do álbum? Tens alguma coisa especial preparada?
O alinhamento vai incluir algumas do álbum, gosto sempre de pôr uma ou duas do EP, para atar tudo. Há canções novas, que não estão nem numa coisa nem noutra. Não sei, não gosto muito de dizer o que vai acontecer, gosto de até à última ter liberdade.
E vais tocar em trio. Suficiente para reproduzir as canções, como estão em disco, ou vais dar novos arranjos?
Têm uma vida própria, ao vivo. Eu toco com este formato, em trio, há bastante tempo, mas nunca senti a obrigação de tentar reproduzir fielmente, porque o disco tem vários overdubs, camadas de guitarra, segundas vozes, e ao vivo é sempre um bocado mais cru, em power trio.
E não sei se queres falar de planos para o futuro. O Alek Rein vai continuar a escrever canções? Vais criar novos heterónimos?
Já pensei nisso, sim. Até porque faz pouco sentido um heterónimo sozinho. Eu forço-me mesmo a tentar escrever em português porque acho que, se eu assumisse a minha autoria, como Alexandre Rendeiro, o Alek Rein acabava por ganhar nesse sentido da heteronímia. E pronto, faço esse exercício de tentar escrever poesia em português, mas são coisas que eu ainda não tenho grande confiança para assumir publicamente. Tenho de testar entre amigos – tenho tantos amigos músicos, são os melhores para avaliar.
https://www.youtube.com/watch?v=9mUwGyIYp1M&feature=youtu.be