Talvez tenha tudo recomeçado em 2008 com Oracular Spectacular. Agora é a vez de Trevor Powers, mais conhecido como Youth Lagoon, habilitar-se a desvendar territórios ondulados e deformados, por ondas de frequência variável. Neste segundo álbum de originais, Powers mergulha num universo diferente do explorado no anterior The Year Of Hibernation.
Comecemos pela capa do disco. E sobre ela poderíamos pairar horas a fio, perdidos nas diversas referências. A ilustração de Wondrous Bughouse é uma evidente apologia ao naturismo: cores pastel, pouco saturadas, leves e suaves; elementos da natureza animal e vegetal representados em ingénuas pinturas, recortadas por linhas curvas a fazer lembrar lágrimas de cornucópia- símbolo de fertilidade, riqueza e abundância; nebulosas planetárias; óvulos prestes a serem fecundados… Tudo iluminado por uma estrela solar. Em suma, um quadro imaginário da infinita existência.
Mas falta-lhe a música. A imaginativa música de Trevor Powers. E se o nome soa a alguém importante, actor de Hollywood ou CEO de multinacional, trata-se pois de um miúdo de 23 anos de Idaho com um sentido de consciência muito próprio. Wondrous Bughouse é um registo que se adapta na perfeição ao rótulo “pop hypnagogic” (estado de transição entre o sono e a vigília), melhor do que a grande maioria dos projectos desta mesma corrente. Powers explora os limites exteriores da embriaguez do sono, induzindo nas suas melodias uma assustadora dimensão de maravilhosas possibilidades.
O álbum é claramente um tributo ao psicadelismo dos Beatles ou dos mais recentes Flaming Lips. Mas talvez a melhor pedra de toque seja a referência à série de animação “Le Manège enchaté” dos anos 60. Tanto de sons maravilhosos como ingénuos balbuciares pueris, a ruminações perturbadas, ficamos com a impressão de estarmos a ouvir música em 3D, num gira-discos com plataforma empenada.
Dentro desta espessura, dum nevoeiro de palavras aparentemente perdidas, Trevor evoca amiúde estados mentais: estados de erro, sensações de alma percebidas no corpo: “The water talks to me/ It teaches me to swim/ Watching my self bath/ Without ever going in”. Em última análise, a sensibilidade de Powers, como compositor, fica algo sufocada pelo reverb constante e a atmosfera alucinada que se impõe ao longo de todo o disco. O momento em que sua visão se torna mais cintilante, dentro da sua própria cabeça, talvez pareça acontecer em ‘Dropla’. O que sobra são sombras de bocados reais com resquícios de pesadelos por fechar.
Um disco especial para engolir de uma só vez e ficar a relembrar.