Sempre gostei de bandas capazes de arriscar. Bandas capazes de produzir uma obra-prima, para logo de seguida partirem a louça toda, saltando por cima dos cacos, até que o sangue derramado lhes possa manchar a carreira. Estes homens nunca falham, mesmo quando o tiro lhes sai pouco certeiro. É um bocado por todas estas coisas que sempre admirei os Primal Scream.
Como se sabe, a banda de Bobby Gillespie tem disco novo, e isso é uma boa notícia. Claro que não é um disco com a grandeza de Screamadelica (perfeito, perfeito, e insuperável), mas também não marca passo, à maneira dos anteriores Riot City Blues (2006) e Beautiful Future (2008). Este recente More Light vagueia por vários territórios e volta a piscar o olho a uma certa onda kraut de que eles sempre gostaram (lembram-se, por exemplo, de “Autobahn 66”?), insinua-se por caminhos mais upbeat, e mergulha uma ou duas vezes em algumas canções próximas do seu histórico trabalho de 1991, embora desta vez sem excessos (nem vestígios, a julgar pelas recentes entrevistas de Bobby) de comprimidos para o cérebro, ou coisas afins igualmente mortíferas. A canção “It’s Alright, It’s Ok“ é o mais perfeito exemplo do que acabei de afirmar, e serve de primeiro single ao álbum. No entanto, e não querendo fazer mais comparações com trabalhos anteriores, o que aqui não falta é soul, soul daquela qualidade gillespiana que os amantes da banda reconhecem à distância. (Não é por acaso que o meu pé vai batendo, enquanto ouço o disco e escrevo estas linhas.) Também é verdade que a passagem dos anos é uma coisa tramada, e estes Primal Scream parecem agora – não arrisco termo mais assertivo – mais tranquilos, mais em paz com os seus demónios (ah, os deliciosos XTRMNTR e Evil Heat, que nunca se afastam muito tempo dos meus ouvidos…) e, portanto, mais adultos e seguros de si mesmos. Ora, na verdade, e nestas coisas do rock & roll, esses predicados nem sempre são coisa boa, o que não julgo ser aqui o caso. Ouça-se More Light numa noite de verão, e tente-se não responder à provocação da capa. Vai ver que valerá a pena, e assim as pazes estarão feitas com os Primal Scream até uma nova oportunidade que, como é típico deles e por isso se adivinha com alguma facilidade, nos pode levar aos mais extremados elogios ou a mais uma deliciosa deceção.
Estou tendo um curso intensivo sobre bandas.