Se olhássemos para este disco como outro disco qualquer, diríamos apenas que 13 é um bom álbum de “metal” mas algo desequilibrado: às quatro canções bem esgalhadas (“End of the Beginning”, “God is Dead”, “Zeitgeist” e a “Age of Reason”) teríamos que as contrastar com as demais (“Loner”, “Live Forever”, “Damaged Soul” e “Dear Father”), que, tendo os seus momentos engraçados, são em geral tão excitantes como uma pescada cozida servida com esmero num hospital.
Acontece que este não é um disco qualquer – é o disco do regresso de Ozzy Ozbourne aos Black Sabbath, depois de uma espera de 35 anos (Ozzy foi expulso da banda em 1979, provavelmente por não lhe bastar a sua quota-parte de coca paga pela editora, não resistindo também a palmar a “snowblind” aos seus colegas). A ideia era mesmo que os quatro fundadores estivessem todos presentes. Se o baixista Geezer Butler também respondeu à chamada de Tony Iommi (o guitarrista, mentor criativo e único elemento permanente na banda), o mesmo não aconteceu com o inventivo baterista Bill Ward, que amuou devido a divergências contratuais (sendo substituído por Brad Wilk dos Rage Against the Machine, que fez um bom trabalho, apesar de não ser tão espontâneo e criativo como Ward).
O que nos fascina neste disco é, precisamente, o seu permanente jogo de espelhos com o passado mítico da banda (os Sabbath dos anos 70), e, em particular, com os seus quatro primeiros álbuns (Black Sabbath, Paranoid, Master of Reality e Vol. 4), discos tão irrepreensíveis como pioneiros. Se uma banda de metal ou de um rock mais agressivo (ou goth rock ou doom ou…) ousasse a blasfémia de afirmar que nada deve aos Black Sabbath, um único contra-argumento bastaria: o riff demoníaco e incrivelmente contemporâneo da canção “Black Sabbath” que abre logo o primeiro álbum. Quais Led Zeppelin, quais Deep Purple: ninguém mais tocava de uma forma tão sinistra e pesada em 1970!
E 13 está todo ele pejado dessas citações nostálgicas. “End of the Beginning” e “God is Dead” (as duas canções mais fortes do álbum) são as filhas bastardas da lenta e aterrorizadora “Black Sabbath” (a que aludimos acima), herdando da defunta mãe as mesmas intempestivas mudanças de ritmo. A “Zeitgeist” – com a sua guitarra acústica, as percussões orientais, a distorção de voz e o solo de guitarra jazzy – é a clara piscadela de olho à psicadélica “Planet Caravan” do segundo álbum, Paranoid. No final da “Dear Father” (a canção que encerra o álbum) ouvimos o mesmo som macabro dos sinos da igreja e da chuva a cair com que o primeiro álbum abre. And so on. And so on… Mas talvez o momento mais comovente de revivalismo apareça no minuto quatro da canção “Age of Reason”: naquele naif “oh Yeah” (tão parecido com a “N.I.B” do primeiro álbum) Ozzy e Tony Iommi esquecem-se por completo da sua idade, das doenças, dos discos falhados, dos reality shows decadentes, das “divergências contratuais”, e, durante alguns segundos, voltam a ser aqueles miúdos de vinte anos, que, vindos da working class da industrial Birmingham, ousaram reinventar de novo o rock.
Para mim, que sou saudosista por natureza, preferiria que os Black Sabbath tivessem ido ainda mais longe no seu exercício de nostalgia, repescando também a produção analógica dos anos 70, com aquela guitarra suja e doce que no encanta nos seus primeiros discos, saída de um amplificador de válvulas que sabemos poder rebentar a qualquer momento. Mas Rick Rubin (o afamado produtor que consegue tornar apelativo comercialmente todo o disco em que mexa) não gosta de correr riscos e entendeu que o som limpinho e digital dos tempos modernos seria uma melhor aposta. Não gosto da assepsia mas o que é certo é que, mais uma vez, Rubin ganhou a aposta: desde o icónico Paranoid de 1971 que nenhum disco dos Sabbath chegava a número 1!
Se 13 regressa ao génio de Vol. 4? Não iria tão longe. O tempo nunca volta atrás e é sempre perigoso voltarmos a um sítio onde fomos felizes. Mas sem qualquer sombra de dúvida que este é o disco que mais honra o legado dos Sabbath desde há muitos, muitos anos.