Parece que 2013 é um daqueles anos em que a maior parte das bandas ou músicos mais importantes da última década e alguns de outras décadas, fazem o seu regresso. Depois dos Strokes, Devendra Banhart, David Bowie ou Nick Cave terem apresentado já o seu trabalho, chegou a vez dos Black Rebel Motorcycle Club (BRMC) também mostrarem o que valem. Atenção aos mais distraídos: Desde 2001, data do seu primeiro disco homónimo, já passaram treze (sim 13 anos!) e seis discos (se bem que praticamente ninguém leva em conta a experiência instrumental de The Effects of 333, lançado exclusivamente via digital.).
O tempo realmente não perdoa e, se para algumas bandas, o tempo é mau, leva-as a deteriorarem-se ou pior, serem esquecidas, há outras como os BRMC que têm um registo muito seu e cada disco a mais é uma adição de valor à sua discografia. Specter at the Feast não foge ao registo. Tem tudo aquilo que temos direito da banda norte-americana. Temos o vigor dos primeiros discos, temos o lado mais introspectivo de Howl, e temos a mistura dos dois, como que um amadurecimento onde se cria um novo estilo.
No que toca às emoções, os BRMC sempre me suscitaram grande curiosidade, há qualquer coisa na voz de Robert Levon Been que nos agarra ao mesmo tempo que nos dá socos no estômago. Apesar de ser norte-americano, Levon Been desde cedo se sentiu atraído pela escola britânica dos anos 80 e início de 90. Robert, ainda um imberbe estudante, e Peter Hayes (membro dos BRMC) partilhavam o gosto por bandas como Jesus and Mary Chain (evidente tanto a nível sonoro como de imagem), Ride, The Stone Roses ou My Bloody Valentine. Porém, apesar de partilharem estes gostos cada um foi para seu lado no que toca a bandas. Peter Hayes fez parte dos Brian Jonestown Massacre enquanto Levon Been foi baixista numa banda menor, The Beggars.
Estava escrito nas estrelas que o par de amigos se juntaria um dia e assim o fizeram adicionando um baterista inglês (porque será?) e entre várias tentativas chegaram ao nome de Black Rebel Motorcycle Club em homenagem ao clube de motoqueiros do personagem de Marlon Branco no filme The Wild One.
Levon Been, Hayes e Nick Jago fizeram tournées com os Brian Jonestown Massacre para limar arestas e o resultado saiu em 2000 com o disco homónimo, BRMC. Disco esse que agarrou logo numa geração desprovida de amor ao Rock (“Whatever Happened To My Rock and Roll? lembram-se?). A banda de Levon Been, juntamente com a banda de Julian Casablancas, “salvou” o Rock no início da nova década. Is This It e BRMC foram marcos naquele que seria o regresso aos mercados do Rock, o qual andava nas ruas da amargura desde a morte de Kurt Cobain, entregue ao nu-metal de bandas como Limp Bizkit, Slipknot e outras bandas das quais não me recordar nunca mais.
Três anos mais tarde seguiu-se Take Them On, On Your Own que viria exactamente no seguimento do disco de estreia, se calhar ainda com mais energia, mais agressivo, poderoso. Eram uma banda para ser tomada em conta.
Contudo o mais estranho aconteceu em 2005. Howl apareceu como se de uma banda nova se tratasse. Uma viragem ao lado mais negro do interior americano. O Blues-Rock puro e duro. Uma surpresa para todos mas a verdade é que é um dos melhores discos da banda. Puro, honesto, saído das entranhas. Porém em Baby 81, lançado dois anos mais tarde, a banda pareceu presa, cansada e sem ideias de valor, tendo tentado voltar ao estilo dos primeiros discos mas sem nunca o conseguir. Não sendo um mau disco, foi claramente um passo atrás. Talvez devido a esta fase menos boa na carreira os BRMC decidiram lançar um álbum instrumental, quase todo electrónico, para desanuviar o ambiente que se vivia. The Effects of 333 passou completamente despercebido ao grande público, e, talvez mesmo ao pequeno mas teve o condão de arrumar a casa aos BRMC. Jaggo largou o seu lugar na bateria, sendo substituído pela baterista das Raveonettes, Leah Shapiro. A mudança foi do dia para a noite e Beat The Devil’s Tattoo (2010) mostra isso mesmo. Voltámos a ter aquele vigor e frescura dos primeiros discos. E o mote estava dado para os BRMC continuarem a ser uma banda a ter em conta, desta vez já não com a missão, árdua, de salvar o rock, mas apenas de o manter vivo e com qualidade. E é isso mesmo que Specter at the Feast é. Manter o Rock vivo, com chama mas amadurecido. Treze anos fazem com que deixemos de ser tão rápidos e enérgicos e o que perdemos em vigor ganhamos em alma, em sentimento e isso sente-se desde os primeiros acordes de “Fire Walker”. Os BRMC já pausam o seu jogo, já olham para os lados ou para trás em vez de estar sempre a lançar bolas lá para a frente. Têm uma estética mais de “shoegazer” do que Rolling Stone mas nunca esquecendo donde vêm.
De referir que a banda, principalmente, Robert Been, estava ferida de morte. O falecimento do seu pai, Michael Been, também ele músico, em pleno backstage de um concerto dos BRMC fez com que este disco tivesse uma aura agri-doce. A homenagem chegou em forma de cover de uma música (Let The Day Begin) da banda do seu pai, The Call.
Em “Returning” sentimos toda essa aura e o pesar da morte de um ente querido quando Robert canta “A part of you is ending, a part of you holds on,” e depois, “But you must leave and not turn back, knowing what you hold/How much time have we got left, it’s killing us, but carries us on…carries us all”. Talvez nunca tivéssmos ouvido a banda tão despida e tão de coração aberto.
Enquanto “Lullaby”, “Some Kind of Ghost”, “Sometimes the Light” e “Loose Yourself” continuam essa toada soturna e de pesar, “Hate the Taste”, “Rival”, “Teenage Disease”, “Funny Games” e “Sell It” parece que são o espectro oposto, uma forma de tentar apagar essa dor com guitarras no máximo.
São doze músicas cheias de pesar, angústia e sofrimento mas ao mesmo tempo de tentativa de aceitar a perda e seguir em frente. Robert Been fê-lo da melhor maneira que um músico pode fazer, compondo boas músicas. O seu pai estará, certamente, orgulhoso…