Escrever sobre In Utero parecia-se ao início como uma tarefa simples. Afinal de contas Nirvana mudou a minha vida, como a de muita gente da minha geração e não só. A geração que nos Estados Unidos se identificava com a angst diagnosticada em “Smells Like Teen Spirit” é a mesma que cá, mais tarde, veio a ser conhecida com a geração rasca. Pouco importa isso. Mais importa é a maravilha deste que se veio, infelizmente, a tornar o último álbum de uma das bandas mais importantes dos anos 90 e da história da música.
O álbum de estreia foi então Bleach ao qual se seguiu o estrondoso Nevermind. Cobain, que não ficou plenamente satisfeito com a gravação de Nevermind, queria novas sonoridades. Queria captar uma maior essência dos instrumentos, uma limpidez que só um exército de microfones poderia captar e para isso chamou Steve Albini, produtor que Cobain admirava pois tinha produzido dois dos álbuns que mais gostava: Surfer Rosa dos Pixies e Pod dos Breeders.
13 míseros dias apenas foi quanto demorou para ficar gravado. De 13 a 26 de fevereiro de 1993. Estavam presentes: Kurt Cobain, depois Chris Novoselic e ainda Dave Grohl. Ao triunvirato juntou-se Albini e ainda o engenheiro de som Bob Weston, fechados no Pachyderm Studio, no Minnesota. A reclusão dos 5, sem interferências nem confusões de outras pessoas, foi essencial e permitiu-lhes a todos dedicarem-se em exclusivo a gravações intensivas. Reza a lenda que a concentração apenas foi quebrada uma vez, por Courtney Love (obviamente) aquando de uma visita de 2 dias para matar saudades de Kurt.
Mas a dedicação que todos tiveram colheu os seus frutos. Saíu daqui um álbum limpinho, cru, consistente, adulto, obscuro, melancólico, agridoce, intenso, poderoso, corrosivo… extraordinário! A sonoridade aqui presente é definitivamente diferente de Nevermind. Não falo das músicas em si, mas do som que sai de cada instrumento. Sempre foi uma coisa que me marcou desde o início. O som meloso mas naquele formato punk/rock. E aí há que dar o mérito a Albini, mas também a Cobain. Para quem apregoava uma certa ou total independência do mainstream e principalmente daquilo que uma editora gosta de controlar, a criatividade, Cobain soube levar a sua adiante. Não basta parecê-lo para sê-lo. Cobain, no meio das suas neuroses, da sua dependência das drogas, da sua relação vertiginosa com Love, era um talento puro, genuíno. In Utero é o melhor exemplo disso. Bem mais do que Nevermind. Como terminava a crítica da Rolling Stone Magazine ao disco, foi o triunfo da vontade. Era este o álbum que Cobain queria fazer e ainda bem. Pena ter sido o último.