A seis de junho de 1985 os Guns N’ Roses davam o seu primeiro concerto e quis o destino que, volvidos precisamente 40 anos, regressassem a Portugal para a sua primeira vez na cidade de Coimbra! Quatro décadas repletas da clássica atitude rock and roll, que se mantém viva até aos dias de hoje. Este concerto não foi exceção: mais uma noite imperfeitamente perfeita!
O pensamento que me ocorre neste preciso momento em que escrevo este artigo, é que o deveria ter escrito mal o concerto dos Guns N’ Roses terminou, antes de ler algumas críticas que foram publicadas no dia seguinte ao concerto, pela imprensa nacional. Alguns desses artigos, mesmo eu fazendo um esforço para que tal não acontecesse, acabaram por me toldar o raciocínio, umas aborreceram-me e outras desiludiram-me. Mas nem tudo o que li foi mau, há muita coisa certeira que foi dita e uma enxurrada de comentários positivos de quem realmente esteve no concerto e viu exatamente o que ali aconteceu, nada mais, nada menos que um enorme concerto de rock n’ roll!
Não, não sou um acérrimo fã dos Guns N’ Roses, nunca fui. Sim, sou um indiscutível fã de rock, obstinado por assistir a concertos de rock onde tudo soa de forma agradavelmente desagradável, onde a atitude tem de ser o ingrediente principal e a amor o elemento que une tudo. A noite de seis de junho de dois mil e vinte e cinco foi tudo isso, uma banda rock lendária que apesar dos seus 40 anos de existência continua com a atitude certa, o mais enérgica possível que a idade lhes permite ser, que deram tudo o que têm e o que já não têm e que inundaram de amor aquele estádio praticamente cheio de gente a delirar a cada tema tocado de forma imperfeita, como se quer num concerto de rock! Agora expliquem-me: como podemos sair de uma noite destas, desiludidos?
Infelizmente não consegui chegar a tempo de ver os Rival Sons, banda que abriu a noite, há dias em que é impossível conseguir fazer tudo. Quando entrei no Estádio Cidade de Coimbra, já estava o palco preparado para receber os Guns N’ Roses e era uma tarefa complicada furar a multidão que esperava ansiosa pela banda americana. Com alguma dificuldade lá consegui arranjar um lugar respeitável para ver e ouvir esta lendária banda.
Sentia-se a alegria daquelas pessoas que esperavam por ver a banda responsável pela banda sonora de grande parte das suas vidas. Uma coisa é ouvir em k7’s, vinis, cd’s ou spotify’s, outra é ouvi-los e vê-los ali bem perto, a algumas dezenas de metros, estar no mesmo sítio e no mesmo momento do que eles. Para muitos, como eu, seria a primeira vez que os via ao vivo, finalmente. Depois de algumas ondas humanas criadas pelo público que se encontrava nas bancadas, eis que chega o momento pelo que todos nós esperamos e os sete elementos atuais dos Guns subiram ao palco para delírio dos cerca de 48 mil fãs.
Logo aos primeiros acordes de “Welcome To The Jungle”, tema de abertura álbum de estreia Appetite For Destructione desta noite, os Guns mostraram ao que vinham. Os braços no ar de euforia instalaram-se e poucas vezes descansariam nessa noite. Depois de uma viagem até ao um projeto paralelo do Slash, os Velvet Revolver, com o incrível “Slither”, veio a primeira explosão de telemóveis no ar em “Live And Let Die” e, volvidos dois pares de canções, chega “Knockin’ on Heaven’s Door” onde toda a gente, literalmente, cantou a canção.
O concerto foi fluindo sempre a um ritmo forte, sem grandes paragens a percorrer os quarenta anos de carreira e os cinco álbuns de originais dos Guns, com exceção ao álbum The Spaghetti Incident?, o mal-amado álbum da banda. Quase a meio do concerto, mais um daqueles temas a aumentarem o número de vozes que acompanham Axl Rose, o carismático vocalista da banda, e um dos meus temas preferidos (senão o preferido) “You Could Be Mine”. Há que destacar o momento “New Rose”, original dos The Damned, tema cantado na integra por Duff McKagan que mostrou o seu inesperado, mas espantoso, lado punk rocker. Logo a seguir momento de improviso de todos os músicos, onde Richard Fortus desbundou à força toda na guitarra, com riffs e solos certeiros e com um final arrebatador da lenda da guitarra Slash que terminou o tema na nota exata que fez estremecer a plateia, porque era precisamente a primeira nota da música que ia ser tocada de seguida, daquelas que não há ninguém que não conheça, que todos os aspirantes a guitarristas (e não só) já tocaram alguma vez, exatamente essa: “Sweet Child O’ Mine”, tema tocado com a devida mestria por todos! Slash que não precisando de apresentações, mostrou que está numa forma incrível, cada nota que tira da guitarra crava fundo na pele e no coração, enquanto corre de um lado ao outro do palco.
De realçar ainda os restantes elementos da banda, o baterista Issac Carpenter, o mais recente elemento da banda, que mostrou estar à altura deste grandioso projeto, Dizzy Reed, que está na banda desde 1990 e ajudou a criar camadas sonoras com os seus teclados e Melissa Reese que embelezou as canções com a sua voz doce e alguns pormenores eletrónicos.
Seguiu-se “Civil War”, tema com uma letra bem atual, infelizmente, e que antecedeu ao momento mais emociante da noite, quando no ecã gigante do palco se vê uma imagem de chuva, Axl senta-se ao piano e começa a tocar “NOvember Rain”, tema épico dos Guns e que foi acompanhado por um mar de luzes que encheu todo o estádio. Momento arrepiante!
O concerto entrava na reta final, com destaque para a belíssima “Patience”, o eterno “Don’t Cry” e o explosivo “Paradise City” que fechou a noite e levou à loucura completa todas as almas que ali se encontravam! Após terem saído do palco, todos os elementos da banda regressaram por breves momentos para se despedirem dos milhares de fãs eufóricos e receberem uma gigante, e merecida, ovação de todos os presentes, que não tinham muita vontade de sair dali!
O rock tem destas coisas mágicas, transformar momentos em memórias incríveis e duradouras. Aquela vai ser mais uma noite que ficará para sempre na memória de todos, como uma enorme noite de rock, de uma banda lendária, icónica, que apesar de não ter dado o concerto “perfeito” (o que isso queira dizer), trouxeram paixão, suor, energia, atitude, garra, amor e música desagradavelmente agradável!
Vi gente sozinha, grupos de amigos, pessoas de tenra idade e outros mais velhos, famílias, pais e filhos a curtirem um concerto rock, todos juntos pelo rock, uns a recordar velhos tempos, outros a criarem novas memórias! Todos levavam um sorriso de orelha a orelha, felizes, saciados e já com saudades daquela noite especial!
Depois de uma noite gigante como esta, desilusão, para quem?
*Fotografias brevemente