Após a experiência que foi O Último Tango em Mafamude (2018), em Miramar Confidencial (2019), David Bruno encontrou o seu espaço como autor. Agora, em Raiashopping, expande e constrói sobre as suas memórias de infância.
Este é mais um vídeo-álbum, ou como quem diz, um disco em que cada canção foi criada com um vídeo a acompanhar. É o terceiro lançamento em três anos e conta com o já habitual Marco Duarte nas guitarras melosas, mas este é um disco pessoal, assume o artista. Todas as canções se relacionam com passar a infância na raia.
Este é o nome comumente dado à fronteira luso-espanhola e onde um jovem David passou muitas férias na terra dos seus avós. Mais uma vez o autor faz uma declaração de amor a uma cultura e a um Portugal que não termina em Lisboa ou Porto. Cafés com cheirinho e pancadaria, a única discoteca na terra, emigrantes em férias e ir comprar produtos mais baratos ao outro lado da fronteira são algumas das imagens que populam o imaginário deste disco. Na “Introdução” ouvimos um poema de Miguel Torga sobre a infância – como se não fosse óbvio o tema – que nos instala confortavelmente nas memórias de um jovem David Bruno.
O disco é entre cortado com quatro “momentos”. Temas instrumentais com imagens caseiras ou retiradas de reportagens. O primeiro com imagens de um café, o segundo com baile, o terceiro com um jovem David Bruno em 1994 e o quarto uma reportagem sobre emigrantes a voltar a Portugal no verão pela fronteira de Vilar Formoso. São, como nos trabalhos anteriores, momentos em que o autor centra e mantém presente o tema sem que se perca o fio à meada ou que soem como uma quebra musical desnecessária. Já o tinha feito anteriormente com álbuns de Conjunto Corona, fazendo crer no disco como um todo, em vez de um conjunto de canções separadas.
O sampling analógico – vamos chamar-lhe assim – continua a ser uma imagem de marca nos discos de David Bruno, utilizando várias influências para criar uma atmosfera de familiaridade, como por exemplo, riffs de Guns ‘n’ Roses no “Café Central” ou a referência a Dire Straits em “Flan Chino Mandarim”. Se em Miramar Confidencial a inspiração vem de um graffiti em Vila Nova de Gaia que levou a uma narrativa de construtores patos-bravos dos anos 90, em Raiashopping as referências são mais soltas e são, como de costume, a prova de um carinho genuíno pelas terras e tradições.

O maior problema é que, embora David Bruno o assuma como o mais pessoal dos seus trabalhos a solo, este Raiashopping não se destaca grandemente do trabalho anterior. A estética a atirar para o vaporwave está lá, as letras simples e com piada também, mas desta feita já não é nada de novo ou surpreendente, com a estrutura de canções a ser um pouco previsível. Música até metade da duração da faixa, depois DB canta/declama/fala e há um solo de guitarra.
Sem dúvida uma declaração de amor à cultura e dia a dia de quem vive na fronteira, é um disco para os portugueses com família na terra, que no verão vêem os primos “avecs”, ouvem as histórias da “Avó Maria”, jogam à sueca com o primo Paulo e vão meter gasolina no país vizinho. É uma boa opção para meter no rádio do carro enquanto se faz para cima de 300km nas férias.