As canções de Jack Tatum, cintilantes e nostálgicas, funcionam como atraentes confecções pop encamadas numa envolvente, por vezes surreal, atmosfera narcotizante rica em detalhes. Persistem não na memória pelos orelhudos refrões ou melodias, mas como estes nos emergem instantaneamente reconhecíveis assim que os revisitamos. O modo como o homem por detrás dos Wild Nothing explora as potencialidades harmoniosas, rítmicas e estruturais de cada uma das suas canções fará porventura com que as mesmas não tenham (ou melhor, não cedam) ao imediatismo dos seus pares, mas aí reside porventura o seu fascínio: a pop como subliminar memória que refulge na sua fascinante totalidade assim que regressamos a ela – talvez a música de Tatum seja a que mais se aproxima, no espectro actual, da concepção literal do dream em dream pop.
Nocturne, o excelente registo anterior, distinguia-se do antecessor Gemini pela riqueza e diversidade instrumental, a beleza dos arranjos e a superior qualidade de gravação, potenciando a experiência mirabolante e absorvente do som dos Wild Nothing. Apontando como influências Todd Rundgren e soul de Filadélfia neste novo registo, a voz de “Shadow” dá proeminência na mistura a uma secção rítmica forte e fluida, sendo clara o papel dos dois na abordagem que Tatum tomou na produção de Life Of Pause. É graças à conjugação de um baixo petulante e inventivo e a persecutória e hábil precursão, presentes em todas as faixas, abrangendo desde krautrock em “TV Queen” à disco em “Reichpop”, que este é o disco mais coeso, homogéneo e fluido de toda a discografia do grupo.
A sensação de espaço físico criada pelas camadas sonoras cativantes de Tatum tem, neste disco, resultados que variam desde o muito bom ao mediano. Infelizmente, encontra-se aqui em falta a dimensão emocional, pungência sónica, criatividade composicional e momentos sónicos inesperados que permeavam Nocturne, ainda o melhor trabalho no seu catálogo. O refrescante solo de marimba na primeira faixa “Reichpop”, seguido por saltitante ritmo acompanhado de óptimos rasgares solares na guitarra, é um dos melhores momentos do disco. Após este, a qualidade fraqueja nas quatro faixas seguintes, um kitsch 80s pouco inventivo, demasiadamente estéril e pouco enérgico. Todavia, após a foleira faixa-título, o disco melhora substancialmente, seguindo-se as faixas mais exploratórias, densas e aventurosas, onde o álbum arrisca mais sair da sua zona de conforto. “Alien” e “Whenever I” incorporam os ritmos sensuais Motown para resultados felizes, esta última com um dos melhores refrões da carreira da banda. A sónicamente irrequieta “Adore”, faixa que melhor conjuga a nova dimensão corporal e dançante de Life of Pause com a etérea e sonhadora dos dois registos anteriores, é um verdadeiro doce para os ouvidos, o seu psicadelismo extasiante, rico em texturas surpreendentes que efervescem e desvanecem para a outras dar lugar, dominado com uma mestria e classe fora do comum, culmina numa jam arrebatadora e hipnotizante. “To Know You” serve-se de uma batida motorik e de um ruidoso sintetizador para dotar a faixa de uma qualidade agridoce e agressiva previamente desconhecida à habitualmente acessível ambiência dos Wild Nothing.
Tatum apresenta ainda um talento nato para pérolas melódicas subjacentes ao imediato nas suas faixas e Life Of Pause é disco para muitas escutas. Todavia, peca por ter um par de canções menos inspiradas e nenhum momento que nos verdadeiramente destoe ou consideremos imprevisível. Aplaude-se a mudança, mas reticentemente sai-se deste álbum com a impressão de que poderia ter sido mais especial do que realmente foi.