Por cima da nossa cabeça, um sistema planetário que parece não ter fim e que este super grupo soube captar a essência. Agora é girarmos à volta de Planetarium para o compreendermos um pouco melhor.
A primeira coisa que me passou pela cabeça, confesso, quando vi este disco, foi um outro, totalmente diverso no tipo e no género, e que é o único álbum de música clássica (eu sei, falha minha com tendência a eternizar-se) que sempre me causou um considerável fascínio. Refiro-me, naturalmente, a The Planets, peça de Gustav Holst do início do século passado. Nessa suite de sete movimentos encontramos composições dedicadas a alguns dos planetas do nosso sistema solar, mas também a presença marcante de figuras emblemáticas da mitologia romana. O curioso é que, numa quase total coincidência temporal, cem anos depois chega-nos Planetarium, obra composta por feras do nosso sistema solar musical, como sejam Sufjan Stevens, Nico Muhly, Brice Dessner e James McAlister. O trabalho, como o título logo indicia, apresenta temas baseados no nosso e em alguns dos outros planetas que nos circundam, havendo ainda lugar a buracos negros, à cintura de Kuiper, bem como um espaço reservado ao cometa Halley, que continua a girar e a brilhar, teimosamente, na direção oposta à dos ditos astros sem luz própria. Um festim astronómico, como se vê. Tudo isto será apenas uma coincidência, sem dúvida, mas talvez um certo tipo de alinhamento cósmico se tenha perfilado para nos dar, no espaço de um século, estas duas obras verdadeiramente solares!
O álbum é conceptual e por detrás dele (ou no centro dele, talvez assim se diga com melhor exatidão) estão quatro nomes de peso. Sufjan Stevens, desde logo, que pouco tempo depois do belíssimo Carrie & Lowell (2015) surge agora a comandar as tropas. Mas não vem mal acompanhado, uma vez que Nico Muhly, o pequeno génio de tantas boas estranhezas contemporâneas, também embarcou na aventura. Para além da dupla referida, outro par de nomes entrou em campo: Bryce Dessner e James McAlister. O primeiro destes últimos, o guitarrista dos The National, tem um papel relevante, uma vez que é das suas cordas que se estende um vasto lençol de sons a lembrar, por vezes, Vangelis (nos seus melhores trabalhos) ou até Mike Oldfield, dos tempos de Hergest Ridge, embora numa hipotética versão só com guitarras. Falta McAlister, baterista que tem tocado com meio mundo, homem chegado a Sufjan Stevens há já algum tempo. Todos são responsáveis por esta sinfonia prog electrónica de efeito nem sempre surpreendente.
Planetarium tem altos e baixos pelo meio dos seus mais de setenta minutos de duração. O mesmo é dizer que alguma irregularidade se vai sentindo à medida que o disco avança. No entanto, quando surgem temas como “Neptune”, a faixa inaugural, estamos perante um superlativo Sufjan Stevens. Ou quando se ouve “Venus”, e aí é Nico Muhley quem mais se destaca, o álbum também se eleva bem acima da mediania. Outros bons exemplos são “Earth” e “Saturn” com beats e vocoders que, no entanto, poderão não agradar a todos. Sobra, no fim, a ideia de ser um trabalho demasiado extenso e que nem sempre corresponde às expectativas que o lote de músicos convocados poderia fazer supor. Considero, mesmo assim, que à medida que o vamos ouvindo em repeat, o disco parece trazer consigo argumentos suficientes para algum crescimento futuro.
Como se sabe, Planetarium surgiu como um projeto para a Muziekgebouw Eindhoven, galeria de arte e espaço de teatro da cidade de Eindhoven. Seria, então, uma extensa peça musical, que anos depois da sua apresentação ao vivo se transformou nesta sequência de dezassete momentos sonoros, sendo que alguns deles são meras vinhetas entre canções. Planetarium não é uma obra-prima. Longe disso, mas não deixa de ser um disco cativante, sobretudo pelo grau de estranheza que vai surgindo, aqui e ali, por entre temas mais clássicos e outros de cariz mais minimalista. É bom de se ouvir, mas não o bastante para entrarmos em órbita.