O “exílio dourado” da maior banda de rock do mundo é o responsável por um dos discos mais ecléticos e brilhantes da história da música contemporânea.
Afastados da sua Inglaterra natal desde a primavera de 71 por questões fiscais, o grupo refugiou-se no Sul de França, mais propriamente na solarenga Villefranche-sur-Mer (perto de Nice). Aí, alimentados por uma dieta à base de drogas e longas noitadas pontuadas por jam-sessions intermináveis na vivenda de Keith Richards – a famosa “Nellcôte” (uma antiga residência usada pela Gestapo como quartel general durante a ocupação francesa) – a banda fez-se ao trabalho para matar saudades de casa.
Sem uma direção artística ou financeira definida (tinham acabado recentemente o seu contrato com o turbulento manager Allen Klein) as sessões de gravação prolongaram-se meses a fio e segundo o discreto baixista Bill Wyman: “nem todos estiveram presentes ao mesmo tempo nas gravações”
Daí que Exile tenha tido imensos convidados de ocasião como o saxofonista Bobby Keys, o guitarrista slide Al Perkins, o teclista Billy Preston e mais uma “catrefada” de convidados, nomeadamente o comparsa de drogas de Richards, Graham Parsons, o escritor William Bourroughs ou Marshall Chess, novo presidente da recém-criada “Rolling Stones Records” que apareciam casualmente só para dizer um “olá” enquanto davam umas passas num charro de ocasião.
Outras vezes os convidados ficavam “à porta” e era quem “calhava” estar presente a tocar o instrumento de ocasião mais à mão. Daí que o guitarra-solo Mick Taylor tenha acabado por por tocar baixo em pelo menos quase metade do disco, ao mesmo tempo que o produtor Jimmy Miller é quase responsável por metade da bateria.
Tudo parecia idílico não fosse em Julho de 71, quando a polícia francesa fez uma rusga surpresa ao palácio dos Stones. Ninguém foi preso, mas esta ameaça foi mais que suficiente para assustar o cada vez mais “junkie” Richards. As sessões prosseguiram a milhar quilómetros dali na azáfama de Los Angeles.
Os Stones mudavam de sítio mas não mudavam de vida. Contudo no ambiente quente e roqueiro de L.A. a banda começou a dar os retoques finais em canções que demonstravam o estado de deboche e caótico da banda: “Rip This Joint” ou “Rocks Off”. Contudo, o quinteto revelava nestes novos temas uma nova alma. Mais negra, cruel, despida de preconceitos.
Os novos “Junkie Stones” continuavam de língua e faca afiada dispostos não só a ser a grande banda de Rock com “Tumbling Dice” (o único hit dos disco) ou “Happy” (cantado por Richards), como ao mesmo que nos davam canções bastante simplórias mas eficazmente acústicas como “Sweet Virginia”, “Loving Cup” ou “Sweet Black Angel”.
O tal “exilio” transformava-se numa série de “polaroids” sob a forma de canções onde os Stones nos mostravam a América perdida e viciada dos Casinos de Las Vegas (“Casino Boogie” e Tumbling Dice”); os blues negros do delta Mississipi (“Shake Your Hips” de Slim Harpo” ou “Stop Breaking Down” de Robert Johnson) ou o ruralismo do Mid-West (“Sweet Viginia) . O rock, o blues, a folk e a country, todos misturados nunca soaram tão bem juntos.
Porém um dos grandes temas esquecidos é precisamente “Ventilator Blues” composto por Mick Taylor. Dizem as más-línguas que o guitarrista saiu (dois anos depois), cansado de ver as suas ideias recusadas constantemente por Jagger e Richards. A verdade é que pela amostra, deveriam ter dado mais oportunidade ao sucessor de Brian Jones. Mas talvez isso fossem “egos” a mais numa banda que em termos super-criativos assinou aqui a sua última grande obra-prima.
O mordaz “Soul Survivor” fecha com chave de ouro o disco e faz a apologia dos tempos seguintes. Os Stones seriam os maiores sobreviventes do Rock, mas a sua criatividade musical (ainda que com alguns bons discos pelo meio) jamais voltaria a tocar estes píncaros.
“Shine a Light…”