Um concerto no Musicbox será sempre um concerto num bar.
Um concerto de William Basinski, feito de silêncios, miudezas sonoras e no seu todo um convite ao hipnotismo, não pede como sala de espectáculos um bar.
Nos bares há conversas, discussões, gritos, copos a baterem nos balcões e uns nos outros, copos a caírem, telefones a tocarem, pessoas a atenderem os telefones que tocam, portas a abrirem e portas a fecharem, pessoas desinteressadas que apenas estão no bar porque é de noite e porque sim.
O concerto de William Basinki foi num bar e logo aí algo se perdeu.
Perdeu-se a importância dos quase-silêncios, perdeu-se a importância da concentração necessária para qualquer espectador ser transportado para fora dali, para longe da cidade dos carros das pessoas, olhos fechados e um respirar intenso, fundo.
Ainda assim a música de Basinski venceu. Ultrapassou as interrupções dos copos e das vozes e foi-se impondo, em crescendum, até silenciar os ruídos e os corpos, ou pelo menos assim o senti. Se calhar a balbúrdia continuou e eu simplesmente deixei de me dar conta dela.
Sons impossíveis, que parecem estar sempre no limite, num lugar onde não cabe mais nada, sempre a isto (junto o indicador ao polegar, como para indicar muito pouco) de rebentar, as colunas não vão aguentar, não vão, um som que nem é grave nem é agudo, é uma coisa, é uma repetição mas não é uma repetição, é um loop mas não é bem apenas um loop, algo que evolui sem nos darmos conta, ondas do mar, o transe das ondas do mar que apenas sentimos à noite e quando não as estamos a ver, ondas que parem estar a aumentar de ritmo e volume e intensidade mas depois percebemos que poderá não passar de uma ilusão, que estão iguais, não estão, julgamos que apenas tudo aconteceu porque entretanto estávamos mais concentrados nelas. Nas ondas.
Assim nos foi mostrado, com recurso a dois reprodutores de fita e um computador portátil, a última obra do autor, Cascade. Como sobremesa, um cheirinho de dez minutos do Disintegration Loops, desta vez sem qualquer manipulação em directo – um simples play. Atitude duvidosa, alguma desilusão. A outra desilusão foi a duração global do espectáculo, que não chegou à uma hora.
Claro que a arte não se mede aos minutos, mas quando se gosta apetece um pouco dizer que sim.