Os Suede não são uma banda qualquer. Foram eles que no início dos anos 90 mudaram completamente o mainstream da pop britânica. Sem o hype criado na altura em seu redor (inteiramente merecido: o primeiro álbum é uma obra-prima absoluta), é provável que malta como os Blur, os Oasis e os Pulp continuassem na obscuridade. Sim: os Suede foram a vanguarda de uma nova cena musical – a Britpop – que enterrou definitivamente a agonizante madchester e deu uma resposta à altura ao bom grunge que se fazia do outro lado do Atlântico. Mais importante ainda, preencheram finalmente o vazio deixado pelo fim dos Smiths em 1987.
Foi então com uma certa mágoa que nós, fãs incondicionais da banda mais glamourosa de sempre, nos deparámos com um Coliseu escandalosamente subocupado, sem gente para preencher as laterais (que foram fechadas), e sem gente sequer para compor devidamente uma plateia rala cheia de “peladas”. O bicho do rock and roll é cruel, todas as bandas têm o seu prazo de validade mediática, e o dos Suede, como o pudemos comprovar com um amargo na boca, está claramente prescrito. De nada adiantou os Suede terem regressado este ano com um bom disco – Bloodsports. Estou convencido que mesmo que os Suede regressassem com um disco do calibre de Coming Up ninguém os quereria ouvir.
Mas foi também com uma enorme dignidade que os Suede (e, em particular, o seu frontman, Brett Anderson) reagiram a essa pedra no sapato. Deram tudo, absolutamente tudo, para que nenhum dos seus fãs da velha guarda saísse desiludido. Não saímos. Brett pulou, dançou, suou, girou no ar o fio do microfone como num rodeo, desceu do palco cantando no meio de nós. São poucos os vocalistas que passam o teste do palco – normalmente, o registo ao vivo é bem mais tímido do que em estúdio – e Anderson passa-o com distinção.
O alinhamento seguiu dois critérios: destaque ao novo álbum (cinco canções) e discriminação positiva dos discos mais fortes: cinco canções para Suede, quatro para Coming Up, duas para Dog Man Star e Head Music, nenhuma para A New Morning. A única injustiça foi o brilhante Sci-Fi and Lullabies (que ficará na história da Pop como a melhor colectânea de lados B de sempre) ter sido representada por apenas uma canção: “Another no One”).
Mas a maior prova da grandeza do concerto foi a sua capacidade de nos comover. Os discos dos Suede não são apenas os discos dos Suede: foram a banda sonora da nossa adolescência (e alguma pós-adolescência), nos bons e nos maus momentos. A viagem no tempo seria assim inevitável: canções como “Two of Us” (“lying in my bed/watching my mistakes…”) trazem-nos demasiadas recordações para que seja possível passarmos por elas com distanciamento emocional. São muito poucas as bandas que se confundem com a nossa própria vida e os Suede estão nesse panteão. Obrigado por tudo, Suede.
Fotografia: Hugo Amaral
Alinhamento:
- Pantomine horse;
- Barriers;
- Snowblind;
- It starts and ends with you;
- Filmstar;
- Trash;
- Animal nitrate;
- We are the pigs;
- Sometimes I feel I’ll float away;
- By the sea;
- The drowners;
- Can’t get enough;
- Two of us;
- Another no one;
- For the strangers;
- So young;
- Metal Mickey;
- She’s in fashion;
- The beautiful ones
Bela reportagem de um belo concerto. Pouca gente quer saber, mas os que quiseram tiveram uma bela noite.