De quantos mundos são feitos os puritanos?
Um concerto que é uma viagem; que são várias viagens, por vários mundos. Tanto nos sentimos num bar algures no médio oriente, como dentro de uma igreja a ouvir canto gregoriano, ou a percorrer a nossa própria existência, que passa por momentos de epifania, de revolta e de caminhos que percorremos como que nos arrastando tentando segurar a nossa própria existência.
Há esta pureza e densidade nos temas do último álbum dos These New Puritans – Field of Reeds – e foi com estes que preencheram o concerto no TMN ao Vivo, em Lisboa, elevados na voz da portuguesa Elisa Rodrigues (que acompanhou a maioria das músicas).
“Spiral” marca o início da viagem, antecedida por sons de carros e motos a deslizar pelo asfalto. O caminho segue por “Fragment Two”, o tema mais convencional do último álbum (e um dos mais celebrados), e “Light in your name”, que me faz recordar o filme de Tim Burton “The Nightmare Before Christmas”; talvez pelo crescendo da música, pelos sons que se assemelhavam a trovoada, um universo negro e ao mesmo tempo pacificador… o estranho mundo deste Jack.
O pouco público deixa-se levar pela viagem (alguns conversam). Tom Barnett apresenta “We want War”, “um tema sobre a paz mundial”, diz, onde os sons remetem a mente e o corpo para ritmos árabes. Antes e depois houve órgãos “a invadir” a sala, momentos de solenidade.
A primeira parte do concerto termina com “V [Island song]”, onde os sons se distorcem, amontoam, num caos sonoro, electrónico, onde o trompete transmite um sinal de urgência, longos minutos que a voz de Elisa acompanha quase sempre sozinha, a caminho de uma epifania.
O encore começa com “Re-want-war” e, como em qualquer concerto que se preze com público português, não faltou (pelo menos) uma declaração de amor; e, por estranho que possa parecer, são os fãs masculinos que mais dão voz a estes sentimentos; para Jack Barnett saiu um “I love you! You’re the new Philip Glass!”. Alguém concorda?
Para o fim ficou “Orion” e a sensação que esta viagem, de pouco mais de uma hora, podia retratar a densa vida de cada um de nós… Afinal, de quantos mundos somos feitos?
(Fotos: Francisco Pereira)