Depois uma boa adaptação ao clima terno e quente nos sofás do B.Leza, ao som de Bombino, as luzes diminuíram a sua potência e fomos para a frente do palco ouvir os samples embebidos em pós-rock de Coclea, projecto do lisboeta Guilherme Gonçalves. Os arranjos sonolentos e viajantes eram feitos ao ritmo das ondas do Tejo, que, ao nosso lado e em harmonia connosco, prosseguia o seu curso. Cíclicas e elípticas, as melodias simples embalavam o público, que fechava os olhos e tentava não desfalecer, como que parado a imaginar-se à tona da água, a boiar, ou numa nuvem, a passar. Os delays de porcelana e os ecos vítreos teciam o ambiente para os Gala Drop, que entrariam de seguida em palco, para apresentar o seu novo disco, II.
A entrada seria triunfal. O público, sedento de voltar a ouvir as sonoridades etéreas dos Gala Drop, aclamava a banda com fervor, antecipando o seu início sideral e transportador, marcado pelos ritmos tropicais e teclados viciados de “You And I”, a primeira faixa de II. A guitarra malandra e vaidosa e o baixo profundo e pujante davam passagem às percussões tribais, que vinham completar a dança, a viagem pela savana até ao deserto, o teletransporte para todos os lugares do mundo e mais algum. Por todo o lado se ouvia Sun Ra e outros amigos, mas os Gala Drop faziam a sua própria dub-electro-kraut-funkalhada, com uma originalidade e qualidade bem visível e quase palpável. Sempre aliados a uma sonoridade esquizofrénica e exploratória, os lisboetas mostraram que são do melhor que a sua cidade tem a oferecer, tocando também temas dos discos Broda (colaboração com Ben Chasny) e Gala Drop.
Com espaço para experimentalismos, solos, slows e uma catrefada de sons e sensações indescritíveis, o quinteto fez a plateia ficar de mau humor quando Jerrald “Jerry the Cat” James, percussionista importado das américas para Lisboa, anunciou que seria a última canção. Seria mesmo, até serem obrigados a voltar para mais um pedaço de música competente e cheia de bom gosto, com as polirritmias infindáveis e inacreditáveis (de Jerrald James, na percussão e Afonso Simões, na bateria), o baixo obeso (de Rui Dâmaso), a guitarra irrequieta (de Maria Reis, das Pega-Monstro) e os teclados (de Nelson Gomes) que nos subiam à cabeça, todos em uníssono, com um groove hipnótico – o público, claro está, delirou com o final. Graças sejam dadas também à voz de Jerry the Cat, pela dimensão extra que acrescentava à música introspectiva e visionária do grupo.
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Fotos: Sofia Mascate