No Cameras Allowed é um documentário que segue James Marcus Haney, pelo mundo dos festivais de música, infiltrando-se como jornalista e conseguindo chegar a algumas das maiores bandas da indústria.
Esta seria a sinopse do filme. Mas chegará para compreendermos a sua verdadeira essência? Claro que não.
O documentário sobre música, produzido pela MTV, conta a história de um aspirante a operador de imagem/fotógrafo de festivais de música que consegue, através de uma acreditação falsa, entrar no festival Coachella, nos EUA, chegar ao pit (local próximo ao palco destinado a fotógrafos) e recolher imagens. Imagens essas que chegam aos olhos de músicos como os Mumford and Sons que, seduzidos pelo seu talento, convidam Haney para os seguir em tour.
Para quem não trabalha na área pode parecer um sonho bonito, o do sucesso através de um golpe de sorte e ousadia, a proximidade com os artistas, a facilidade com que se pode conhecer uma estrela. Mas a realidade impõem-se e suscita algumas questões.
Para conseguir uma acreditação para um evento de música, o jornalista tem de estar ligado a um meio de comunicação, a quem será atribuída essa mesma credencial. Um festival como o Coachella terá, certamente, mais pedidos de acreditação que aqueles concedidos, permitindo à produção escolher quais os principais meios, nacionais e internacionais, que querem ter na cobertura do seu certame. Mas, Haney, infiltra-se com uma pulseira falsa, feita propositadamente para a ocasião. Vamos pensar que a façanha é conseguida e ficamos com essa questão respondida.
Outro aspecto curioso é o facto de, Haney, conseguir chegar ao pit de concertos como o dos referidos Mumford and Sons. Na zona de imprensa, nos concertos mais mediáticos, a resposta do management dos artistas é afixada com os escolhidos, nem todos têm acesso e seria muito improvável escolherem um meio que não existe. Mas vamos, novamente, pensar que o concerto estava liberado para todos os meios, o que é possível. Já possível não será filmar. Os seguranças e produtores do evento estão atentos às máquinas usadas no pit e, só meios de comunicação como canais de televisão, têm permissão para filmar e mesmo isso é restrito, raramente há televisões no pit, têm espaços próprios para a captação dessas imagens.
No entanto, pode sempre acontecer a segurança falhar alguma pulseira e não conseguir controlar uma entrada mais apaixonada. Mas, existem filmagens feitas em cima do palco e aí, a trama adensa-se. Nenhum jornalista ou fotógrafo tem acesso ao palco, para além de não haver acesso do pit para o palco, o tipo de pulseira para lá chegar também é outra, ou a pulseira de artista ou a pulseira de All Access e o que Haney tinha era uma pulseira de imprensa e uma camera, nenhuma das duas são bem recebidas em palco. A não ser que seja um repórter que acompanhe o grupo e faça parte da sua entourage. Na eventualidade de Haney sequer lá chegar, seria imediatamente expulso do palco.
Podíamos enumerar muitas outras incógnitas sobre o documentário mas há uma que se eleva. O uso das imagens requer sempre autorização e a sua reprodução é limitada, nunca seria permitida num filme comercial, a não ser que os intervenientes já soubessem e acordassem sobre esse destino. E aí desfaz-se o conto de fadas.
No fundo, No Cameras Allowed é um documentário que anseia por esperança. Sejamos cínicos, nesta quadra natalícia e, aceitemo-lo como tal. O glamour da indústria musical que, com um pouco de arrojo, talento, e quebra de regras legais, pode ser infiltrado e traduzir-se na fama imediata de um fã. Que um aventureiro pode ser bafejado pela sorte de maravilhar uma das maiores bandas mundiais e acompanhá-los na tour, sem trabalho, sem contactos, sem esforço. O expoente máximo desta pureza só foi registado uma vez e foi no filme Almost Famous (Quase Famosos) de Cameron Crowe, de 2000, quando William pergunta a Russell “So Russell… what do you love about music?” e Russell responde, “To begin with… everything”
No Cameras Allowed será exibido na próxima quinta-feira, dia 2, no MuviLisboa 2015, pelas 16h30. O evento tem lugar no Cinema São Jorge, em Lisboa, entre os dias 1 e 6 de Dezembro, com uma forte programação nacional e internacional de curtas e longas-metragens, videoclips, retrospectivas, palestras e concertos.