A história do ‘underdog’ e do macho alfa.
Pode o talento ficar perdido, à deriva, se formos sobretudo dotados para projectos inacabados e se a nossa dedicação durar o mesmo que um bocejo? Conseguimos resgatá-lo? Se acreditarmos no que diz a mãe Berninger diríamos que sim, afinal ela tenta, com toda a convicção, que o filho mais novo acredite que sempre foi o mais talentoso dos dois irmãos. Mas, se pensarmos que o irmão mais velho é Matt Berninger, continuamos a dizer que sim?
“Mistaken for Strangers”, mais que um pretenso documentário sobre os The National, é um filme sobre os dois irmãos, o ‘underdog’ e o macho alfa dominante, como, a dada altura Aaron Dessner, guitarrista, os descreve; e é uma exposição crua de Tom, do relacionamento deste com Matt e com a banda, numa digressão em 2010 da qual acaba demitido a pouco mais de meio. Era a ’tour’ de “High Violet” e o início do processo de criação de “Trouble Will Find Me” (ao ver o documentário dei comigo a pensar que talvez o nome deste último trabalho tenha surgido a Matt enquanto pensava na decisão que tomou ao deixar Tom seguir viagem com ele e com os restantes The National…).
Não terá sido por este motivo, mas Matt Berninger reconheceu que o documentário “teve um efeito significativo no novo álbum” e que a primeira música – “I Should Live in Salt” – é sobre o irmão. Além disso, afirma, “aproximou-nos muito enquanto banda” e mostrou um lado menos “negro” e mais divertido.
No caso de Tom deixou outra evidência…que não irá fazer carreira como realizador de documentários, como disse Matt; o irmão continua a viver na casa dele, em Nova Iorque, tem feito alguns cursos ligados ao cinema, escrito alguns argumentos, enquanto tenta perceber o que fazer com o sucesso que o documentário lhe trouxe. “Tem sido uma grande mudança para ele, não tem sido um caminho fácil, mas está mais confiante”, referiu Matt, numa sessão de Q&A após a exibição do filme.
Fora do registo documentário, o vocalista dos The National expôs-se um pouco mais perante a audiência. Reconheceu que “Boxer” foi talvez o disco mais difícil de fazer, porque depois de “Aligator” houve a pressão de decidir se seguiriam no mesmo registo ou se alterariam – “fizemos algo diferente e penso que foi a decisão certa” – e que no processo de escrita das letras das músicas também alterou o método… “ajudou-me quando comecei a pensar menos nas letras e mais na melodia, sentado frente ao portátil com um copo de vinho”, revelou entre risos. Se Matt Berninger me pudesse ver agora perceberia o quanto o compreendo… ao fundo o som é ‘National’ e à secretária, ao lado do computador, há um copo de vinho tinto, nacional “também”.