O viveiro de Coimbra volta a atacar. É lá o centro geográfico dos Mancines, que agora se estreiam em disco com Eden’s Inferno.
Vamos por partes.
Os Mancines – homenagem ao génio de Henry Mancini – têm na sua linha da frente gente como Tony Fortuna (com passado punk em bandas como os incontornáveis Tédio Boys), Raquel Ralha (Wraygunn, Belle Chase Hotel, por exemplo), e Pedro Renato (Belle Chase Hotel, etc), sob a direcção de Gonçalo Rui e com Luis Formiga na bateria. As coincidências com o som da antiga banda de JP Simões são mais que um acidente, e é para essa referência que este disco nos atira, repetidamente.
Mas se os saudosos Belle Chase Hotel faziam este som mas com um pé num certo tipo de urgência – e eventualmente alguma falta de meios – os Mancines conseguem um disco coeso, mais complexo, mais calmo, mais opulento.
A grande maioria dos temas são cantados em inglês, com as excepções, em italiano, a cargo da sempre sedutora Raquel Ralha. O universo remete-nos para a Europa de entre-guerras, com ecos de piano-bar, casinos luxuosos com boas cadeiras de veludo. Estes ambientes completam-se com uns toques muito bem-vindos a lembrar a chanson e o cançonetismo de décadas mais tarde.
A ligação a Henry Mancini não é inocente. O mestre dos ambientes e das bandas sonoras faz todo o sentido nestas músicas, algumas das quais não passariam vergonha pintando um dos velhos James Bond da altura de Sean Connery. Música cinematográfica, portanto, no bom sentido. Há ainda tempo para namoros com a música brasileira em algumas orquestrações, alguns avanços kitsch sem nunca chegar a ser cheesy, os sons de outros tempos que, estranhamente, nos fazem sentir mais confortáveis.
Tony Fortuna mostra-se à vontade neste registo, ainda que próximo do registo de JP Simões (que visita os seus velhos amigos para a óptima “An Amazing Vision”), servindo aquilo que é, sobretudo, um colectivo. O próprio disco recomenda um consumo como um todo, fatia após fatia, de forma a reforçar a coerência do universo aqui criado.
Mais uma boa dádiva musical de Coimbra para o país. Um disco de outros tempos, que nos sabe bem neste começo de Outono e nestes tempos tão imediatos e tão acelerados.