Uma das mais gratas surpresas sonoras de 2014 dá pelo nome de Les Big Byrd. São suecos, e lançaram um disco merecedor da máxima atenção. Foi isso que fiz, e sem qualquer ponta de arrependimento. É, aliás, mais um sério candidato a constar da nata da colheita anual, que neste site costumamos fazer lá mais para dezembro. Falo, obviamente, em nome próprio, e admito que essa escolha venha a ser exclusivamente minha. Pouco importa isso. O que quero destacar, acima de tudo, é a surpresa que tive há pouco mais de um mês, quando me chegou às mãos (ou melhor, aos ouvidos) o disco They Worshipped Cats, dos já referidos Les Big Byrd. O que aqui temos diz-se de forma simples e quase instantânea: eletro-rock psicadélico, uma pitada de kraut (um pouco de Neu! e Harmonia, outro tanto de Cluster em ambientes de echo-vocal a lembrar en passant os anos 80, embora tudo isto num tom mais luminoso, que sinistro), temas ritmados que impedem qualquer um de ficar quieto, e acordes de base com alguma glória e estilo. Mais ainda: vocais que por vezes lembram os Pink Floyd pós Barrett, por quem nunca morri de amores, diga-se. A substância cósmica do seu conteúdo está bem espelhada na capa do disco, como é fácil perceber.
They Worshipped Cats abre com “Indus Waves” e é sublime o ritmo motorika que nunca se perde, nunca desacelera, acompanhando uma voz que canta, em segundo plano, enquanto um irrequieto sintetizador vai viajando por cima da forte batida da canção. “Tinnitus Ætérnum” apresenta-se logo a seguir, abrindo espaço para mais outro percurso por terrenos far-out. É de uma viagem que se trata, convém não esquecer, e uma vez tirado o bilhete não há volta atrás. Deve ser bem poderosa ao vivo, esta dupla composta por Frans Johansson e Joakim Åhlund! O disco avança com a canção que dá nome ao trabalho, e aqui nota-se bem o gosto pelos Neu!, por exemplo, numa faixa instrumental repetitiva nos processos musicais, mas que resulta muitíssimo bem. É o kraut psicadélico no seu melhor, e nada há a fazer. Resulta sempre.
Seguem-se “Vi Borde Prata, Men Det Är För Sent”, canção cantada na língua nativa, depois a francamente bela “Just One Time” (com vocoder a lembrar um pouco os Daft Punk dos primeiros tempos) e de novo a repetição rítmica assumida e com pé no acelerador em “White Week”, espécie de jam session que poderia nunca terminar, perdida espaço afora, infinitamente bela e flutuante. “War In The Streets”, o tema seguinte, diferencia-se um pouco das anteriores composições, apostando mais numa linha claramente pop. Talvez por isso seja a canção menos conseguida, na minha opinião, embora esteja longe de me desagradar. A caminho do fim há ainda tempo (e espaço, claro, se é que me entendem…) para “1,2,3,4 Morte”, prenúncio de contagem final para o fim da viagem. Mas a nave ainda vai alta, e a festa continua sempre a bombar, non-stop, non-stop, non-stop until the end, que chega com “Back To Bagarmossen”, última paragem deste They Worshipped Cats, virada de novo ao pop mais prazenteiro, mais preocupado com a estrutura típica de uma canção comum.
O prazer de ouvir They Worshipped Cats todo de seguida é assinalável. Funciona melhor assim, pela ordem previamente estipulada das canções, do que de forma aleatória, ouvida em qualquer um dos spotify deste planeta. Como se houvesse uma narrativa melódica que impossibilitasse outro percurso, que não o proposto, guiando-nos num tempo e num espaço muito próprios, para nos deixar, no fim, presos ao doce veneno dos Les Big Byrd. Este é o primeiro longa duração da banda, e com a fasquia tão alta que aqui foram capazes de mostrar, ficarei atento ao próximo passo. Com um bocado de sorte, não há de tardar.