Começam a faltar palavras para qualificar Laura Marling. Com apenas 25 anos, vai no seu quinto álbum em sete anos, e os últimos dois discos colocaram-na num patamar assombroso de qualidade.
Depois do magnífico Once I Was An Eagle, um dos melhores discos de 2013 para a redacção do Altamont, regressa agora com Short Movie.
Muito se passou nos últimos dois anos. Marling abandonou Inglaterra e foi viver para os EUA, fixando-se em Los Angeles. Tem descrito em entrevistas recentes o que isso significou pessoalmente e, para alguém que escreve música de forma tão íntima, isso necessariamente seria ouvido no resultado final, neste disco.
E, para começar, podemos ficar descansados: não foi por andar perdida em Joshua Tree que quis mudar o seu som e tentar ser algo que não é, ao contrário do que aconteceu, por exemplo, com os também britânicos Arctic Monkeys. A estrutura das canções continua a ser assente na voz de Marling e na sua guitarra (que ela maneja com uma mestria cada vez mais invejável).
O registo acústico domina, mas tal como em trabalhos anteriores há espaço para alguma electricidade contida. Aquilo que distinguia Marling, e continua a fazê-lo, é as suas letras, naturalmente, mas sobretudo a forma adulta, inteligente e quase autoritária com que as debita, por cima de uma base que começou no folk mas que se espraia por outros géneros, sempre com grande qualidade melódica.
O que temos, desta aventura americana? A própria artista admite que, por ter começado muito nova, nunca teve tempo para ser jovem e para, simplesmente, viver. Mudando de ares para um “continente assustador”, onde pôde desaparecer e experimentar o descontrolo de não conhecer ninguém e de não ter planos, Marling encontrou novos desafios, e uma faceta sua ainda não explorada. O que impressionava em trabalhos anteriores era a forma como ela se expressava, com uma certeza e uma maturidade que os seus anos nunca fariam adivinhar. Aqui, temos uma Laura Marling com menos certezas, com mais dúvidas, mesmo com medo (chegou a admitir o “pânico” de viver num país tão grande e tão estranho como os EUA). No entanto, não se espere encontrar aqui estados de alma histriónicos “a la Florence Welch”. Temos fragilidade, sim, mas não temos descontrolo. O que temos é a tristeza onde ela faz sentido, logo seguida pela vontade de lutar, de descobrir um caminho. A auto-análise, sem qualquer tipo de comiseração, é um atributo da inteligência de Laura Marling, que mesmo em contexto estranho mantém intacta a sua capacidade de nos contar a vida como ela é. Segura, inteligente, talentosa, é esta moça do alto dos seus 25 anos, tendo pela primeira vez assegurado totalmente a produção de um dos seus discos. O desafio, para o futuro, é se esta fortíssima matriz sonora e imagética de Marling consegue regenerar-se e transmutar-se em algo de novo, ou se continuará a fazer discos sólidos e bem feitos, mas sem a capacidade de surpreender, que talvez seja o único defeito deste Short Movie.
É ainda impossível dizer se este disco, lançado em Março, irá superar, no longo prazo do julgamento do tempo, o seu antecessor. Mas que, com poucas semanas de rotação, mostra total capacidade para isso, tal é certo. Para nós, não há mais dúvidas. Laura Marling é um caso sério e, apesar de jovem, o corpo de trabalho que já conseguiu apresentar deixa-a como a maior (a única?) candidata ao trono de Joni Mitchell.