A festa do rock é quando o Itenerance Fest quiser!
No mês em que andamos a ressacar das festas de final de ano e que se pauta pela escassez de eventos culturais, eis que surge o Itenerance Fest, um festival que promete curar a ressaca e dinamizar esta época menos fértil. Esta foi a segunda edição deste festival e aconteceu nos dias 16, 17 e 18 de janeiro, três noites que começaram frias e terminaram em fogo! Uma enorme saudação para a Alexandra Monteiro Martins e toda a equipa por terem criado um evento tão incrível como este! Precisamos deste tipo de eventos e de gente com a vossa energia e paixão! Longa vida ao Itenerance!
Dia 1
O primeiro dia do festival foi de boas-vindas, acolhimento, conversas e um prévio aquecimento. Tudo começou na Oficina Cobalto, local de receção dos festivaleiros e onde estava preparado um espaço onde iria decorrer a primeira atividade do festival.
Esta atividade, foi uma conversa entre representantes de associações / coletivos que têm vindo a organizar eventos culturais em diferentes localidades do país. Estiveram nessa conversa o Rui Alexandre, responsável, entre outras coisas, pelo Mosher Fest que acontece em Coimbra, Carlos “Cafi” Sousa, responsável pelo Inferno Das Febras Fest que acontece em Lousada, Luís Masquete, fundador da promotora Machamba, entre outras atividades e Ricardo Riscas, responsável pelo coletivo Salitre sediado em Espinho, sendo a conversa orientada pela principal responsável do Itenerance Fest, a Alexandra Monteiro Martins. Foi um momento muito interessante, onde todos os intervenientes partilharam a sua experiência como partes integrantes destas organizações tão importantes para o desenvolvimento cultural das localidades onde se inserem, criando espaços e palcos para artistas emergentes, e não só, se mostrarem e darem os primeiros passos. Destaco a paixão com que falaram dos seus projetos e a coragem pela força que têm em lutar por estes projetos tão importantes no desenvolvimento cultural.
Terminada a conversa, era altura de descer em direção ao Douro, com paragem obrigatória na rua que se situa ao lado da icónica estação de São Bento, a Rua da Madeira, onde toda a ação iria decorrer.
Para este dia, o palco escolhido foi o do Barracuda Clube de Roque e a banda a cargo de dar início às hostilidades foram os lisboetas El Saguaro. Este power trio com influências do rock psicadélico dos anos 60 e 70, dão um brilho próprio às suas composições com poderosos solos de guitarra e riffs a convidarem ao primeiro headbanging da noite. A perfeita entrada para esta edição do Itenerance e a estabelecer o padrão de qualidade para todo o festival.

Seguiram-se os portuenses Brainless Duck, também eles em formato power trio, mas desta vez a trazerem um som marcadamente stoner metal, forte, sujo e intenso. Uma prestação poderosa a condizer com os três adjetivos referidos na frase anterior. Um projeto que já editou dois EP’s e prepara a edição do primeiro longa-duração, que verá a luz do dia ainda este ano.
A fechar a primeira noite, mais uma banda da casa, os Ideal Victim. Este quarteto chega, diz o que tem a dizer e vai-se embora, curto e grosso, tal como as leis do hardcore ditam. Incríveis, como sempre, com a enérgica e irreverente vocalista da banda a provocar os primeiros movimentos mosh deste festival. Foi curioso ver algumas caras de espanto quando o concerto terminou ao fim de pouco mais que vinte minutos e, ainda assim, com um sorriso de satisfação no rosto!
Dia 2
Segundo dia do evento e primeiro dia, propriamente dito, do festival. As atividades dos próximos dias foram alternando entre Ferro Bar, Barracuda e Era Uma Vez No Porto para que ninguém perdesse nada.
O palco escolhido para o primeiro concerto do dia foi o do Ferro Bar, prontamente ocupado pelos Acid Misery, projeto que nos chega de São João da Madeira. O som, entre o sludge, o hardcore e o metal é partilhado de forma intensa pelos elementos da banda, que colocam toda a sua energia em cada tema que executam, de tal forma que as dores de costas do vocalista são facilmente esquecidas e o headbanging é inevitável! Poderoso!
Do Ferro para o Barracuda, onde nos esperam os Hazing Lungs. Os aveirenses têm no seu instagram a seguinte descrição do som que praticam: “Stoner Alien Shiet”. Ora bem, de Shiet não têm nada, de Stoner têm tudo e de Alien concordo completamente! Som forte com riffs marcantes e a voz gutural que nos leva até outros universos do rock, em sintonia com a atitude punk, fizeram deste concerto um momento memorável e a deixar excelentes indicadores para os próximos capítulos dos Hazing Lungs!
De volta ao Ferro, agora para receber um nome conhecido da praça, os portuenses Redemptus. Com uma década de existência, este projeto tem já uma bonita história para contar e, durante a qual, têm percorrido por diversos caminhos do universo rock/metal, tentando, como eles próprios o dizem, esborratar as linhas que separam esses diversos estilos, para que tudo se funda e transforme numa sonoridade muito própria. Este concerto foi mais uma prova da mestria deste power trio, que protagonizaram um dos momentos altos do Itenerence e a roçar a perfeição.

Hora de descer até ao Barracuda, para ver um projeto que conheci há uns largos meses nos Maus Hábitos, os Palegazer. Na altura eram uma dupla que entretanto se transformou em power trio, com a inclusão do novo baixista. A verdade, é que desde essa prestação nos Maus, há uma evolução notória, uma coesão mais forte, um som mais maturado e interessante. Uma atuação com a casa cheia e a energia melancólica e intensa a encher a sala.
Era altura de mudar de pouso e ir até ao Era Uma Vez No Porto, para assistir à atuação dos Lavra. Bem, e esta atuação foi como entrar num balão de oxigénio, num mundo novo, onde a força da gravidade é bem menor e começamos a flutuar, sim, dessa forma mesmo, como se estivéssemos na lua. Sobre o experimentalismo sonoro criado por ele, a voz dela, conta poemas, rimas, histórias que nos fazem questionar sobre tudo. Um belo momento de relaxamento e introspeção.
Espírito limpo e de regresso ao Barracuda, ainda com os músculos relaxados e a nossa mente a divagar. E como sair desse transe? A resposta foi dada logo nas primeiras notas do concerto dos Pledge, que foi como uma bofetada sonora que nos fez regressar à Terra. Que estouro de concerto! E, a vocalista da banda era a mesma pessoa que tinha visto minutos antes, encostada à parede a assistir aos concertos dos seus colegas, sossegada? Não pode ser, mas era! Irreverente, explosiva e a loucura tomou conta da nave Barracuda! Talvez, ou melhor, com toda a certeza o momento mais explosivo do Itenerance 2025!
Depois disto, a noite continuou no Era uma Vez No Porto, com os DJs Johhny Gil, B2B e Bernardo Matos, que colocaram os mais audazes a dançar até às 6 da matina! Estava feito o primeiro dia, venha o próximo!
Dia 3
Chegámos ao último dia do Itenerance, as baterias perto do cem porcento e prontos para mais umas belas doses de Rock and Roll!
Como no dia anterior, a primeira atuação teve início no Ferro Bar e hoje foram os Phase Transition os primeiros a subiram ao palco. Este projeto é um trio oriundo do Porto composto por bateria, guitarra, violino e voz, que prepara o lançamento do primeiro álbum, que sairá ainda este ano. Um concerto apaixonado onde podemos viajar entre a música clássica, através das belíssimas melodias que saíram do violino de Sofia, e o metal progressivo que transpirava do ritmo forte da bateria e do virtuosismo do guitarrista. Estava dado o arranque deste terceiro dia de festividades!
A esta altura, a rotina de subir e descer a Rua da Madeira, já estava entrosada e já nem precisava de pensar onde ir a seguir, ou seja, Barracuda. A primeira banda, desta noite, a atuar neste palco foram os bracarenses Mau Jesus. Consigo, trouxeram os seus dois EP’s, o último editado em 2024 e o som arrastado e psicadélico que os carateriza. Sala cheia, de pessoas e de sons deliciosos que conquistaram a plateia que os ovacionou grandiosamente. Mais uns quantos fãs que levam do Itenerance!
Mais uma subida, para o último concerto a acontecer no palco do Ferro Bar, nesta edição do festival. Os protagonistas foram os eborenses Awaiting The Vultures, um projeto que não passa despercebido dos mais atentos, com mais de uma década de existência e com dois álbuns na carteira, o último, intitulado Circle, editado em 2024. Ao Porto, trouxeram a intensidade patente em cada um dos seus temas de post metal abraçado ao rock progressivo e instrumental, protagonizando uma atuação de enorme qualidade!

Estas alternâncias entre palcos foram perfeitas, nada como um pouco de ar frio para nos limpar o palato sonoro e nos deixar purificados para a próxima atuação. Da capital, para o Barracuda, os Orum, nome que é um anagrama da palavra Muro. Bem, e ouvir esta banda é como bater num muro, tal a intensidade e energia que colocam em cada tema. Aquelas notas exageradamente deliciosas e longas de baixo, aquelas melodias da guitara que furam a nossa pele e a bateria precisa, conquistaram-me e a quem ali se encontrava. Um dos momentos altos do Itenerance e uma ótima surpresa! Pelo menos, mais um fã levam daqui!
Hora de dar um pulo ao Era Uma Vez, para ver o projeto Superalma, um projeto experimental de música eletrónica. Aqui não existem regras, linhas condutoras ou castradoras, apenas divagações cósmicas e histórias contadas de forma não linear. Uma atuação original que terminou com a expressão “Free Palestine” projetada numa das paredes que fez aumentar o volume dos aplausos que se ouviam!
Regresso ao Barracuda, desta vez para encerrar este palco e as atuações de bandas, encerramento que ficou a cargo da única banda estrangeira que integrou o line up do Itenerance 2025, os Al Final Solo Habrá Cenizas (AFSHC). Esta dupla poderosa chega-nos d’ A Coruña e trouxeram até à invicta riffs graves e demolidores. A melhor forma de descrever o que ali aconteceu nessa noite é a própria descrição da banda: “dois punks na lama a tocarem riffs apocalípticos!”. A melhor forma de encerrar as atuações deste incrível Itenerance!
Tal como na noite anterior, a noite prolongou-se até às 6 horas, no Era Uma Vez No Porto, com a ajuda dos DJs Ascenscia, B2B e Rivers.
O Itenerance Fest volta em 2026!
Texto e Fotografias: Jorge Resende










































































