Muitas bandas há provenientes da Suécia. Desde os extintos Hellacopters, passando pelos setenteiros doom Witchcraft, o colectivo hippie Dungen, os psych-bluesy Graveyard, os enigmáticos e tribais Goat ou pelos mestres da hipnose Hills, a Suécia tem um output musical fora do comum. Tão único e com uma qualidade tão acima da média que uma pessoa começa a ponderar se há alguma substância na água da Suécia que permite a imaginação voar e criar tanta música boa.
Na verdade, existe sim um passado musical imenso e um poço que continua a encher balde atrás de balde quando se começa a investigar o que havia nos anos 60 e 70 naquele país escandinavo.
Do mesmo modo como o Krautrock é inovador, inventivo e cheio de referências, a cena escandinava em geral é um mundo próprio e singular que, talvez por não haver tanta facilidade de intercâmbio como entre a Alemanha e o Reino Unido, passou mais despercebido ao resto da Europa e aos amantes de música com laivos psicadélicos.
Eis então alguns exemplos a conhecer ou a redescobrir com um aviso do autor: as palavras ou termos ‘hipnose’, ‘peso’ e ‘improviso’ vão ser repetidos várias vezes ao longo deste artigo.
MECKI MARK MEN
Em 1967 sai o álbum dos Mecki Mark Men. É um dos primeiros senão o primeiro exemplo conhecido de psicadelia sueca. Aqui, como começava a acontecer na Alemanha, os novos sons que estavam a emergir de Inglaterra e dos Estados Unidos começavam a influenciar o mundo da música um pouco por todo o lado. Aliando uma estética mais jazzística com uma sensibilidade escandinava, estava lançado o mote para novas direcções e novas roupagens musicais. Como base, há algum imediatismo garage e/ou freakbeat mas com viagens mais profundas do que as concebidas pelos homólogos americanos, ingleses e até alemães. Dos membros fundadores, Thomas Mera Garz (bateria) é o nome que aparece mais tarde nos Pärson Sound, Träd, Gräs Och Stenar, International Harvester e Harvester.
BABY GRANDMOTHERS
A primeira banda sueca a ir tocar aos Estados Unidos, os Baby Grandmothers afastam-se da estrutura do formato canção e, algo influenciados pelos Cream e por Jimi Hendrix (com quem fizeram uma tour escandinava em 67/68), exploram e aumentam a componente de improviso sendo muito mais livres do que os exemplos citados como inspiração. Os Baby Grandmothers vão mais ao fundo da psique humana, percorrendo pesadelos negros de onde muitas vezes o regresso é feito com algum custo. Na altura, editaram apenas um single na Finlândia. No entanto, eram umas das mais proliferas bandas escandinavas e em 2007 sai uma antologia com o sete polegadas e gravações de concertos que atestam o brain-fucking de que eram capazes de alcançar estes suecos. Nota de rodapé, alguns dos membros dos Baby Grandmothers formaram mais tarde os folky progressivos Kebnekajse.
PäRSON SOUND
Quando o mestre americano do minimalismo Terry Ryley tocou na Suécia, a sua marca fez-se notar quando um colectivo decidiu juntar a estética minimalista ao rock psicadélico até às últimas consequências. Com nada editado na altura, os Pärson Sound são das bandas mais influentes a sair de Estocolmo. Este colectivo hexagonal é pródigo em longos improvisos carregados de peso pré-sabbathiano, fruto também de um violoncelo que age como uma zoada interminável que hipnotiza e mantém o motor a rolar. Lentos e poderosos, os Pärson Sound estão na origem de bandas como os Träd, Gräs Och Stenar, International Harvester e Harvester. Em 2001 sai finalmente uma colecção de músicas que todos podemos agora apreciar e perder a cabeça.
TRäD, GRäS OCH STENAR
Das cinzas dos Pärson Sound, surgem os Träd, Gräs Och Stenar, que significa árvores, relva e pedras. O nome é reflexo do som praticado por esta banda que contava com alguns suspeitos do costume da cena sueca. Igualmente exploratórios, a banda esteve activa durante boa parte da década de 70 e realizou algumas reuniões em tempos mais recentes para nós, comuns mortais não escandinavos, podermos apreciar o seu psicadelismo infectado de melancolia e hipnose. Com uma discografia algo extensa e interessante, os Träd, Gräs Och Stenar faziam edições em quantidades pequenas, captando boa parte das gravações em concertos na floresta e recapturando alguns dos momentos altos dos projectos anteriores.
INTERNATIONAL HARVESTER / HARVESTER
Também das cinzas dos Pärson Sound, os International Harvester editaram dois álbuns, ‘Sov Gott Rose Marie’ e, já como Harvester, ‘Hemåt‘. Utilizando alguns temas já tocados como Pärson Sound, este grupo continua as explorações sónicas começadas anteriormente mas com talvez mais leveza. Não obstante, o mesmo estilo e aproximação ao instrumentos permeiam a obra da banda, levando a estética do improviso mais longe e com mais intensidade do que outras bandas da época de outros países. De notar que os Goat acabam os seus concertos com o arranjo tradicional sueco ‘Kristallen Den Fina’ (cuja tradução para português, Lindo Cristal, perde algum encanto) num modo à lá Harvester.
ARBETE OCH FRITID
Pegando no espírito e cancioneiro tradicional sueco (e não só), os Arbete Och Fritid (Trabalho e Tempo Livre) são talvez os menos extremos e de mais fácil audição. Com influências mais mundiais no seu som, os Arbete Och Fritid faziam versões de Rolling Stones e Jimi Hendrix (ou Bob Dylan, autor do ‘All Along The Watchtower’) e juntavam também elementos folk e instrumentação mais refinada com sopros a juntar-se à festa de improviso coeso. Da sua discografia, o álbum do mesmo nome mas de 1973 (edição em CD) é altamente recomendável pois aqui os Arbete Och Fritid percorrem sonoridades que vão de laivos progressivos a freak-outs sónicos e o épico tema ‘Ostpusten/Vastpusten’, que é uma autêntica viagem do Oriente para o Ocidente em 20 minutos.
TURID
Com nomes de folk como Vashti Bunyan, Karen Dalton ou Linda Perhacs a ser alvo de atenção para os caçadores de tesouros musicais, é algo espantoso como o nome Turid escapou ao radar de muita gente. Com uma sonoridade mais próxima do acid folk britânico de uns Comus se tivessem a Buffy Saint-Marie como vocalista, Turid é uma proposta mais calma do que as anteriores deste artigo. Informação sobre esta lenda é escassa, sabendo-se que tem uma discografia de 1971 a 1982. Desaparecendo durante algum tempo, Turid fez um regresso aos palcos em 2000, tendo sido editada uma antologia em 2010 (‘Stars And Angels’, Cherry Red Records) que se concentra na sua obra entre 1971 e 1975.
NOVEMBER
Para terminar esta viagem à Suécia, os November são um power trio caracterizados por um som mais blues-rock. Lembrando bandas como os Cream, Led Zeppelin ou Black Sabbath, os November têm três álbuns na sua discografia de um rock duro mas não desprovido de alguns elementos de improviso. O grande destaque da obra dos November vai para ‘Mount Everest’ que abre o primeiro disco, lançando o mote para a obra dos November. Activos de 1969 até 1972, os November (que tiraram o nome do facto de terem tocado com os Fleetwood Mac de Peter Green no 1º de Novembro), reuniram-se para um concerto no já mítico cruzeiro sueco Melloboat, festival organizado pela Mellotronen (loja de discos de Estocolmo).
Artigo de Carlos Ferreira
E os Made in Sweden? Bom som, tb!