Um catamarã, um armazém com half pipe e uma tarde húmida de outono: o cenário improvável de uma matiné punk no Barreiro. No Gasoline, o espírito DIY encontrou forma e som com Grand Wreck, The Youths e Rival Clubs.
Domingo. Quatro da tarde. Primeiro dia de Outono a sério. Uma viagem de catamarã que nos leva de Lisboa até ao Barreiro, sobre ondas tranquilas, a embalar-nos para o que viria daqui a nada.
Com o sol escondido sob nuvens cinzentas e a humidade a prometer gotículas nos nossos braços, chegámos ao Gasoline, prontos para uma matiné punk, daquelas à antiga.
Gasoline é uma Associação Cultural e Desportiva, que promove desportos de ação, skate e surf, como nos diz a sua página. Numa espécie de armazém, decorado com um half pipe (o nosso palco improvisado), grafitti e posters em todas as paredes, skates pendurados, sofás de cada nação espalhados, casas de banho (limpas) com rabiscos e autocolantes diversos, impossível não sentir a onda adolescente a descer em nós e a garantir aquelas borboletas na barriga, lembrando quando tínhamos 15 anos e íamos a sítios parecidos, achando que aquilo era a cena mais cool de sempre (e era).
Somos, certamente, enviesados, mas haverá lá sítio mais perfeito para uma matiné punk, em que desde que se entra lá dentro, se respira o sentimento de DIY, cena bastante orgânica, sem ser pedante e paternalista, criando um ambiente acolhedor para assistir concertos punk.
Para cimentar o sentimento nostálgico já instalado, fomos recebidos pelos sons pulsantes e apunkalhados do dj set das Rat Girls in High Heels (Marta San e Inês Estiveira – parte dos The Youths).
GRAND WRECK
Os primeiros a subir ao half pipe foram os Grand Wreck (Fernando Chovich – vocalista e guitarra, H. Reis – baixo e Thiago di Fonzo – bateria), formalizando a estreia ao vivo (com banda) do projeto de Chovich.
Apesar de ser a primeira vez que tocam (como banda) ao vivo, nota-se que há uma sinergia bem latente entre os três e com um som coeso e amadurecido. Com ritmos acelerados e energéticos, rapidamente a puxar o suor de nós e das paredes, conseguiram cativar o interesse do público presente (vimos um ou outro par de pés a dançar).
Foram 45 minutos de ritmo frenético, músicas diretas e honestas, fazendo um set equilibrado.
THE YOUTHS
Veteranos da cena punk portuguesa, os The Youths (Nuno Sota – vocalista, João Vairinhos – bateria, Inês Estiveira – baixista, Pedro Paulos – guitarrista e Fernando Chovich – guitarrista), continuam a fazer o que sempre fizeram: juntar energia, consciência política e convicção. Sabemos, faz parte da cena punk hardcore, mas conforta-nos o coração ver que continuam a existir bandas que ainda têm algo a dizer, não só através da música, mas também do discurso entre canções, sem ser uma coisa performativa.
Com o público mais solto, assim que soaram os primeiros acordes, já havia pessoas a saltar e dançar. Sota, carismático como sempre, mistura movimentos suaves e irrequietos, o seu corpo verdadeiramente eléctrico, cheio de tensão, prestes a rebentar. A banda soou bem oleada, alinhada, séria, mas divertida, conseguindo aquele ténue equilíbrio de quem exige uma reacção, ao mesmo tempo que nos dá abertura para expulsar as energias, não deixando ninguém indiferente.
RIVAL CLUBS
Por último, e com direito a luzes apagadas, surgiram os Rival Clubs (Azul – voz, guitarra; Tony -voz e baixo; Ricardo – bateria; e Lucas – voz e sintetizadores) a brindarem-nos com o seu som post-punk e new-wave.
Numa onda menos punk hardcore, mas não menos inquietante, arrastaram o público com as suas guitarras mais cruas, ritmos mais diretos e os elementos de sintetizadores que proporcionaram uma atmosfera mais propícia ao anoitecer que já se instalara.
Um fim de tarde que, entre a introspeção e o caos, deixou claro: o punk português continua a ser despretensioso, suado e de coração aberto.
Fotografias: Gonçalo Nogueira






















