On Tour, disco gravado ao vivo em 1969, não só é o pináculo da carreira do duo Delaney & Bonnie, como também marca o início das carreiras a solo de Eric Clapton e George Harrison. Um acervo histórico que urge (re)visitar.
Esta aventura começa como uma história de amor. Delaney conhece Bonnie. Apaixonam-se, casam e formam um grupo folk e têm sucesso moderado. Fim de história.
Esta poderia ter sido a nota de rodapé que os meios de comunicação poderiam escrever acerca do duo Delaney & Bonnie, não fosse o facto do casal ter sido a alavanca para as vidas futuras de George Harrison e Eric Clapton. Mas, como em qualquer (boa) história, tirando o original Guerra das Estrelas, tudo tem um início.
Delaney Bramlett, nascido no ocaso da década de 30, no Mississippi, cedo foi para a confusão de Los Angeles, recomendação dada pelos seus amigos Leon Russel e J.J. Cale. Fez parte da banda fixa de um programa de variedades chamado Shindig! e lançou alguns singles a solo, sem grande aceitação.
Do outro lado da moeda, Bonnie O’Farrell, natural de Illinois mas criada em St. Louis, começou como voz de apoio de alguns cantores importantes, como Albert King ou Little Milton, até se tornar na primeira mulher branca (com uma peruca preta a esconder os seus belos cabelos loiros) a ser uma Ikette, no grupo Ike & Tina Turner. Bonnie acabaria por se mudar para Los Angeles, acabando por conhecer Delaney numa sala de bowling local. Em duas semanas estavam casados. Intervalo.
Do casamento aos primeiros discos foi um pequeno passo. Os dois primeiros, Home e Accept No Substitute, ambos lançados em 1969, não tiveram grande sucesso comercial. Mas o que não conseguiram ganhar em bens materiais ganharam em notoriedade e respeito entre os seus pares, tanto em solo nacional como no estrangeiro. Assim resultou o convite para fazerem as primeiras partes da tour dos Blind Faith nos Estados Unidos. Para quem não sabe, os Blind Faith foram um supergrupo que incluia os membros dos Family, Ric Grech e Steve Windood e dos Cream, o baterista Ginger Baker e, claro está, o virtuoso da guitarra, Eric Clapton. O supergrupo teve pouca duração. Clapton não conseguia estabilizar numa banda, pois o som que procurava era outro. A tour passada com Delaney e Bonnie fez o antigo guitarrista dos Cream finalmente enveredar pelo seu próprio caminho e pelo blues que já o tinha feito sair de bandas anteriores, como os Yardbirds.
Juntando-se à carruagem de Delaney e Bonnie durante o ano de 1969, e, incentivado pelo duo para começar a acreditar na sua voz, o Slowhand começou a preparar as suas músicas para o seu primeiro disco a solo. Enquanto isso não chegava, Clapton ia-se divertindo sendo apenas mais um na banda de Delaney e Bonnie. Quando chegaram ao Reino Unido, também George Harrison e Dave Manson se foram juntando à comunidade folk-blues.
On Tour, disco gravado no concerto que a banda deu em Croydon, no Reino Unido, em 1969, é composto por apenas oito músicas que vão dos originais a covers, passando por um tributo a Robert Johnson (“Poor Elijah), um medley de Little Richard e a primeira colaboração entre Delaney e Clapton (“Comin’ Home”). O registo de som (uma mistura de blues, gospel e folk) é o mesmo que iremos encontrar nos primeiros discos a solo de Clapton, incluindo Layla and Other Assorted Love Songs, uma obra-prima, que contou nas suas fileiras com a maior parte da banda de suporte de Delaney e Bonnie. Estes mesmos elementos também estiveram na matriz do álbum triplo All Things Must Pass, de George Harrison. Ele que também participou em On Tour, sob o pseudónimo de L’Angelo Misterioso.
O disco, que acabaria por levar o duo Delaney e Bonnie pela primeira vez às primeiras páginas dos jornais e a ter tempo de antena, é de uma alegria extrema. Nota-se que os músicos estavam realmente a divertir-se e isso percebe-se nas músicas, nas vozes poderosas de Bonnie, Delaney e Bobby Whitlock, mas também nos solos fantásticos de Clapton e na força do resto da banda a manter o som coeso e vibrante.
Não mais o duo teria um sucesso tão grande, e Delaney e Bonnie acabariam mesmo por se divorciar em 1973, mas On Tour ficará sempre como uma polaroid de um ano fantástico. Fim.