Assim que tocam os primeiros acordes de Upside Down Mountain, logo reconhecemos a jovial voz de Conor Oberst, força motriz dos Bright Eyes, um dos nomes incontornáveis da nova geração de cantautores americanos nascidos nos idos anos de 80. Uma vaza intrigante, esta, que se dividiu em duas frentes: os que sucumbiram à música para as massas e abdicaram da relevância; e os que souberam jogar com a atenção que alcançaram a seu favor. Com alguns deslizes no caminho, situemos Oberst algures entre os dois.
Quantas foram as horas passadas a escutar I’m Wide Awake, It’s Morning ou Lifted or The Story is in the Soil, Keep Your Ear to the Ground, dos Bright Eyes, de onde Oberst nunca largou o leme. Eram histórias que remontavam mais à adolescência do que à maturidade de um artista que passou mais de metade da sua vida na ribalta, ainda que timidamente. E que, nos entretantos, se foi reunindo com outros amigos para fazer música sob diferentes cognomes – mas, justiça lhe seja feita, inércia não é exactamente coisa de que Oberst sofra: desde os seus treze anos lançou mais de duas dezenas de discos, com qualidade oscilante.
Não sentimos tanto a sua falta pelos expansivos registos com a Mystic Valley Band (sem querer cair em armadilhas, arriscaríamos dizer que a contenção sempre jogou mais a seu favor do que as tentativas de excomungar as alegrias desta vida), mas é em pleno 2014 que Oberst se volta a encontrar no tempo, e no seu espaço em específico. Com uma mãozinha de Jonathan Wilson na produção (que, no passado ano, nos ofereceu um dos mais brilhantemente executados trabalhos de reinvenção da americana), as faixas compiladas em Upside Down Mountain formam um produto com uma fluidez de certa forma surpreendente.
Uma wall of sound analógica introduz-nos “Time Forgot”, que se dispersa entre uma rarefeita mas cativante mistura de cordas no topo da sua execução: Oberst e as vozes emprestadas das irmãs Söderberg (vulgo First Aid Kit) em remate de uma composição particularmente bem alinhavada. E bem se nota, depois, esta dicotomia entre a euforia e a introspecção: logo no duo “Zigzagging Towards the Light” e “Hundreds of Ways”, em disparo de energia a ser acalmado logo de seguida com “Artifact #1” / “Lonely at the Top”.
Também notamos que Oberst não necessita, neste contexto, de se sentar sozinho à guitarra para expurgar os seus demónios. Chega a ser condescendente nas frases que profere sobre a vida, mas não o poderíamos levar a mal: não desconfiamos de conversa fiada, e podemos acreditar na substância com que reveste as palavras.
Mas, sem confusões, “Upside Down Mountain” é um álbum claramente americano (passemos o cliché): as oscilações que o percorrem são um perfeito localizador espacial, e não detectamos problema nessa frontalidade. O strumming da guitarra de “You Are Your Mother’s Child” não consegue evitar com que as palavras caiam nos lugares comuns da poesia de um músico de blues que toca num bar despovoado e com os vidros partidos no meio de um nenhures particularmente americano.
O trio final, numa crescente apoteose com “Governor’s Ball” e “Desert Island Questionnaire”, desagua numa tímida “Common Knowledge”. Terminou a viagem, e é tempo de começar uma nova.