Até onde somos capazes de nos levar como ouvintes? Encabeçando o projecto musical Xiu Xiu há mais de uma década, Jamie Stewart é porta-voz das mais retorcidas e perturbadoras narrativas disponíveis ao ouvido humano. Por entre sintetizadores estridentes e atonais, sons desconcertantes, ruído ensurdecedor, percussão histriónica e uma sensação de proximidade desconfortante estão expostas sexualidades violentas, relações grotescas e abusivas, o lado mais hiperbolicamente monstruoso da ação humana.
Cantada do ponto de vista de um personagem afectado com o vírus do VIH/SIDA, o refrão de “Hives Hives”, faixa do primeiro álbum da banda (Knife Play, 2002), é a doença soletrada em jeito operático e dramático, os seus versos as confissões sopradas num último arfar antes da morte desejada. Teclados dissonantes e uma bateria errática e hiperactiva vão entrando em completa combustão simbiótica, duelando furiosamente até uma coda violentíssima e auto-destrutiva. Sentimo-nos como um convidado num funeral de caixão aberto, onde a única razão para este não estar fechado é a curiosidade mórbida dos seus entes supostamente queridos. A violência é palpável, a vontade de ficar para ver o desastre também.