Um disco terrivelmente bonito, entre a tristeza e a esperança no dia de amanhã.
Bill Ryder-Jones tinha 13 anos quando foi um dos fundadores dos ingleses The Coral. A vida corria-lhes bem, tinham sucesso comercial e sobretudo crítico, mas em 2008 o músico bateu com a porta. Sofria ataques de pânico, tinha medo de multidões, andava num estado permanente de ansiedade. Retirou-se então para um lugarejo no norte de Inglaterra, construiu lá um estúdio e é de lá que vem fazendo a sua música, sempre interessante.
Este lechyd Da (Boa saúde, em galês) é já o seu quinto disco a solo e aquele que promete finalmente dar-lhe a atenção que merece. É um trabalho de uma beleza aterradora, feito de canções lentas e de voz sussurrada, como se Ryder-Jones tivesse quase medo de cantar bem alto aquilo que sente. E não é para menos: uma pandemia, uma dolorosa separação amorosa e os problemas de saúde mental do costume constituem um cocktail que, nas mãos e na voz de alguém menos sensível, poderia resultar num disco absolutamente depressivo. Ora não é isso que acontece aqui.
lechyd Da tem lá tudo isso, atenção, mas servido sempre por grandes canções, muito agradáveis de ouvir, partindo de uma base acústica e suplementado por cordas, indo desde a folk-pop a lembrar Belle and Sebastian ao doo-wop de “I know that it’s like this (Baby)”, logo a abrir, com um fantasmagórico sample de “Baby”, canção de Caetano Veloso pela voz de Gal Costa.
Se as canções são bonitas e imersivas, é quando escutamos com atenção as letras que este disco ganha todo o seu significado. É um disco de separação, de ansiedade, de desesperança mas de alguém que quer ficar melhor, quase numa lógica de “estou mal mas não faz mal, ainda aqui estou”.
Este é um trabalho sem palha e que deve ser consumido como um todo. Ainda assim, podemos destacar a tristeza desesperada da lindíssima balada “A bad wind blows in my heart pt.3”; o sentido pop de “If tomorrow starts without me” ou de “I hold something in my hand”, muito Belle and Sebastian; o coro infantil de “We don’t need them”, a elevar o sentimento ao máximo; a emoção de “This can’t go on”, como uns Arcade Fire de pantufas; ou o sussurro de “It’s today again”, com a sua luzinha de esperança a brilhar por entre o breu.
lechyd Da é um disco aterradoramente humano, num tempo em que precisamos disso. Saiu em janeiro, ficou logo no radar, mas foi perdendo tempo de antena perante coisas mais chamativas e mais óbvias. Que não nos deixemos enganar: este é um disco que cresce e cresce e cresce, e que nos conquista cada vez mais.
Dor, amor, esperança, em 48 minutos do mais belo que vamos ouvir este ano.