Concerto de estreia da tour do recente 7 criou ambiente sonhador e cativante junto dos fãs fiéis.
Conhecem aquela expressão “fool me once, shame on you; fool me twice, shame on me”? Não sabemos se é verdade, mas apostaríamos sem receio que é algo que terá passado na mente dos Beach House quando chegaram pela segunda vez ao Armazém F, na sua última passagem por Lisboa, e viram que era a mesma sala onde tinham actuado em 2013 (nessa altura sob o nome de TMN Ao Vivo) e onde preferiam não regressar.
A merecer um concerto em nome próprio na capital desde essa altura (recordamos que após estas datas a banda apenas voltou para actuar em dois festivais nortenhos), finalmente a redenção chegou este ano, com o convite para tocar no Coliseu dos Recreios, uma das salas mais emblemáticas de Lisboa e do nosso país, que se viu bem composto e pronto a acolher de braços abertos a francesa Victoria Legrand e o norte-americano Alex Scally.
Mas já lá vamos. A primeira parte da noite ficou entregue aos Sound of Ceres, banda que se estreou ao vivo em Portugal, como referiu a vocalista Karen Hover a certa altura, e que encantou com um espetáculo visual diferente do habitual, que deixaria orgulhosos os responsáveis pela criação daqueles screensavers fractais que todos nós temos ou já tivemos nos nossos computadores. Não descurando a parte sonora, o jogo minimalista de luzes foi o destaque dos cerca de 40 minutos em que os Sound of Ceres estiveram em cima do palco do Coliseu, acabando por se despedir num bonito mar de pontinhos de luz.
O duo sediado em Baltimore, transformado em trio quando toca ao vivo com a adição de um baterista, ocupou os seus lugares em palco pelas 23h, no primeiro concerto desta sua nova digressão europeia de apresentação de 7, disco editado este ano e que leva os Beach Housea derivarem um pouco do caminho que traçaram há alguns anos atrás.
Absorvidos na sua própria escuridão, quase sempre em contra-luz durante todo o concerto, a banda atira-se a “Levitation”, “Walk in the park” e “PPP”, abrindo o jogo. Sim, é a apresentação de um novo álbum, mas inteligentemente os Beach House polvilham esses momentos com regressos ao passado que, justa ou injustamente, roubaram quase todas as atenções.
“PPP” e “Space Song” de Depression Cherry, receberam mesmo das maiores ovações da noite de um público que sentiu mais para si as músicas da banda do que vibrou propriamente com elas. E não há mal nenhum nisso, a música dos Beach House presta-se a tal e ganha um novo alento quando o instrumental sobe de volume gradualmente, Scally é finalmente rodeado por uma aura de luz e Legrand se debruça sobre o teclado ou expurga os seus e os nossos demónios numa voz carregada de reverb, na maior parte das vezes imperceptível, mas sempre no ponto.
Como todas as relações, também a nossa com Beach House teve os seus obstáculos, mas a história de amor entre eles e o nosso país continua a ser construída de forma segura e consciente. No encore, entre a muito bem recebida “Myth” e a catarse final de “Dive”, Victoria Legrand partilha com o público um agradecimento especial, dizendo-nos que Lisboa lhes deu um dos primeiros concertos na Europa onde se sentiram realmente amados, e de facto não é difícil de acreditar.
Tudo está bem quando acaba bem e três anos depois desse espectáculo em Lisboa o sonho pop dos Beach House materializou-se onde devia, permitindo-nos regressar de forma confortável à casa de praia onde tantas e outras vezes fomos felizes.
Texto: Hugo Rodrigues || Fotografia: Inês Silva