Luís Nunes está a preparar o funeral de Walter Benjamin. Sob este alter-ego, lançou dois discos e outros tantos singles e EPs, mas agora está na hora de seguir, por outro caminho, escrito em Português.
Nesta entrevista, Luís Nunes fala-nos sobre a ascenção e queda de Walter Benjamin, o concerto e festa no Lux, ao mesmo tempo que desvenda os trilhos que quer esgravatar no futuro.
Altamont: Luís, estás prestes a enterrar o Walter Benjamin, mas comecemos pelo princípio – como nasceu este projecto?
Luís Nunes: Walter Benjamin nasceu em Lisboa, durante os tempos da faculdade e nos tempos de uma editora sediada no Barreiro, que era a Merzbau, e nasce de uma necessidade minha de fazer música à margem de uma banda que eu tinha na altura, que se chamava Jesus, The Misunderstood, que tinha vários membros, cada um com a sua ocupação para além da banda, e eu senti necessidade de fazer música além disso, ou seja, não estando dependente dos horários de outras pessoas, de ter uma liberdade criativa para tocar com quem eu quisesse….
Mas isso é porque já tinhas na tua cabeça uma identidade estética, que Walter Benjamin foi seguindo?
Acho que isso foi depois acontecendo um bocado organicamente e o tempo foi ditando isso. Eu tinha uma ideia de fazer uma coisa diferente duma banda, e isso ditou realmente o que é o universo estético de Walter Benjamin. Os primeiros discos e EPs não têm aquele formato de banda clássico, tem batidas, tem outros elementos, que são mais do quotidiano de um quarto.
Sentes que há uma temática que te é mais favorita, nas canções de Walter Benjamin, e que agora irás deixá-la?
Sinto que houve várias temáticas, ao longo dos discos que fui fazendo. Sinto que agora vai haver uma mudança grande, porque a mudança de língua implica uma mudança de foco, uma mudança de visão, uma mudança de universo, que é um universo muito mais específico nosso, muito mais exclusivo. Sinto que essa mudança vai existir.
Recentemente chegaram duas canções novas – uma inédita, outra re-gravada – o que me podes dizer sobre esta “Drive Anyway”, que tem um vídeo que recupera essa imagética londrina que acompanhou Walter Benjamin durante alguns anos.
Exacto. Este “single” – eu chamei-lhe single por piada – que tem estas duas canções, eu queria que na despedida ficassem registados dois momentos importantes para mim. Um dos momentos importantes foi a minha vivência em Londres e a “Drive Anyway” foi uma música que eu gravei em Londres com um amigo meu, e que iria aparecer num disco, que seria o próximo disco de Walter Benjamin, e seria um disco a que nós chamávamos de “ficção científica”, que basicamente era um bocado anárquico e nós achámos que esta era a melhor saída para explicar a coisa. Nesse vídeo eu quis deixar registado exactamente esses momentos em Londres, nós vivíamos numa espécie de república, de músicos, era um grupo muito engraçado e muito interessante, e então quis deixar registada essa fase que foi fundamental para mim, enquanto pessoa, e para o Walter Benjamin. Depois a outra canção, “We Might Never Fall In Love”, é uma canção antiga, do primeiro álbum The National Crisis, é uma das canções mais emblemáticas ao vivo porque as pessoas acabam por cantá-la, e a versão original não é muito boa. E eu queria deixar um registo diferente, uma versão mais definitiva da canção, e ao mesmo tempo queria celebrar isso com os meus amigos de cá, de Lisboa. E nestas duas canções temos esses dois universos distintos, que são povoados por pessoas diferentes, mas que têm todos muita importância na minha vida e nas canções.
E esses amigos vão estar no concerto de 12 de Dezembro no Lux?
Sim e vão estar tanto de Lisboa como vem o Jakob Bazora, que é o meu grande amigo austríaco, já cá esteve muitas vezes em Lisboa a tocar comigo. E vou ter os You Can’t Win Charlie Brown, pelo menos parte deles porque não cabemos todos no palco, vou ter a Francisca Cortesão, vem a minha banda reforçada, com dois bateristas, vem o Manuel Dordio que tocou comigo muito tempo, vem a Selma Uamusse, que é uma grande cantora e é uma pessoa que tem um entusiasmo que eu aprecio muito. Vou ter também o Domingos Coimbra e o Tomás Wallenstein dos Capitão Fausto, porque eu acho que também é importante… Há muitos círculos na música portuguesa e apesar de hoje em dia haver uma união, é uma época rara de união entre os músicos portugueses em que toda a gente se conhece e há muitas colaborações, ainda há muito aquele círculo dos que cantam em inglês e os que cantam em português e eu achei engraçada a ideia de trazer para este universo de músicos que na sua maioria cantam em inglês uma banda que canta em português e que tem músicos fantásticos, e por que não haver esse convívio mais aprofundado.

Tu também fazes muito trabalho de produção, com músicos que também cantam em português. Isso de alguma forma despertou o teu interesse em matar o Walter Benjamin e cantar em português?
Não, isso é tudo consequência de uma coisa que é… Quando em estava em Londres… Eu tenho o hábito de ao pequeno-almoço ler o jornal na internet. E eu em Londres abria todos os dias o site do Público e houve uma altura em que a crise era mais mediática, hoje em dia já temos mais assuntos para falar felizmente, mas houve uma altura em que era especialmente duro ler as notícias e isso criou algum desconforto em mim, alguma preocupação e fiquei um bocado inquieto. E tu começas a ganhar uma perspectiva muito diferente daquilo que é o nosso país, começas a ganhar uma perspectiva de fora. Ou seja, o cantar em português, o querer cantar em português, o tentar escrever em português vem junto com a minha vontade de voltar para Portugal. Eu quero começar a escrever em português, e começo a fazê-lo em Londres, então quero voltar para Portugal e quero pensar sobre isto no meu país, é o chamamento para casa, tudo vem junto.
E vais agora voltar ao Lux, para mais uma festa Black Balloon, onde estiveste há cerca de um ano a reinterpretar The Queen is Dead dos Smiths. Recordas alguma coisa de espectacular dessa noite ou do trabalho a preparar esse concerto?
Essa foi das noites mais incríveis! Eu guardo essa noite na minha memória e vou guardá-la para sempre, para já, porque representa no meu trajecto pessoal… Eu tinha voltado para Portugal há muito pouco tempo e portanto não havia melhor maneira de voltar, foi praticamente o meu primeiro concerto em Lisboa depois do meu regresso, e lembro-me de estar fechado um mês a estudar as músicas dos Smiths e a ver como é que ia fazer, que instrumentos ia usar.
Ainda tocas alguma coisa disso nos teus concertos?
Não, não.
Nem vais voltar a tocar?
Não. Nós chegámos a fazer mais dois concertos, em Guimarães e no Porto, a tocar este disco, mas depois decidimos que já chegava. A verdade é que tu não podes repetir uma coisa que já foi incrível, o primeiro beijo não repetes, só há um. Está na nossa memória.
Podemos falar já sobre o que será o novo projecto? Já tens ideia de quem queres a trabalhar contigo ou um prazo para revelar esta nova encarnação?
Eu quero que as primeiras coisas saiam em 2015. Eu tenho ideias muito concretas, mas basicamente eu tenho de acabar com este projecto [Walter Benjamin] para conseguir focar-me a 100% em escrever canções novas, em criar um novo projecto, em fazer um disco, em pensar as canções, etc., que é um trabalho mesmo difícil, é sair da zona de conforto. As pessoas que me vão rodear serão essencialmente as mesmas – eventualmente chamarei outras pessoas para fazer determinadas coisas, isso está tudo em aberto e é o que eu gosto, é o que eu gosto em Walter Benjamin, e isso vai continuar, não vou de repente deixar de tocar com as pessoas com quem tocava e sai uma coisa completamente nova.
E como é que vai soar, quais serão as diferenças para Walter Benjamin, ou vai haver semelhanças?
Haverá com certeza alguma coisa de Walter Benjamin no que vai acontecer a seguir, porque eu não andei estes anos a enganar as pessoas, eu fiz uma coisa na qual eu acreditava e que eu sentia e era a minha maneira de sentir a música. Agora, como nenhum disco.. se vires os discos do Beck, o Odelay não é igual ao Sea Change, e o Mellow Gold é diferente… O Walter Benjamin, se tivesse continuado, o disco que iria sair era um disco completamente diferente daquele que saiu antes. E isso também vai acontecer, é uma evolução, é outra fase, é escrever sobre outra coisa, é explorar outro som e é isso que me fascina enquanto músico.
Neste concerto do Lux não vais tocar nenhuma canção nova?
Não, porque eu quero fechar. Não vai haver nenhuma revelação do que virá aí por uma questão também de respeito por aquele período, que para mim foi muito importante, foi a parte mais importante da minha vida, digamos, e por respeito a isso, eu quero fechar bem, em festa, não quero estar a confundir as pessoas com outras coisas.
E depois do concerto vais estar a passar música. O que é que podemos esperar de um dj set pós-concerto de despedida de Walter Benjamin?
Vai ter que ser animado. Eu quero dançar a noite toda. A minha imposição para eu passar música é que eu quero dançar a noite toda e se houver uma música que me apeteça muito ouvir naquele momento vou lá e ponho a música a tocar. Não, aquilo é uma festa para toda a gente se divertir, o que eu quero é que seja divertido. Eu tenho uma mala de discos que trouxe em Londres, que quando fiz anos resolvi fazer uma festa de anos na Casa Independente, para que todas as pessoas que fizessem anos naquela semana pudessem celebrar os seus anos, e basicamente o que eu fiz foi tocar esses discos. Essa mala tem discos que eu coleccionava das lojas de segunda mão, das “charity shops”, e tem coisas como T-Rex, Freddy Mercury, Kinks, Beatles, tem um bocado de tudo, aquela do “Too Sexy For My Shirt”, Stevie Wonder. Mas eu também sou uma pessoa eclética e acho que numa festa tudo cabe.