Mais do que aquecer as hostes, os Spin the Skull limparam-nos a cabeça de porcarias que fomos acumulando durante a semana e eletrizaram-nos o corpo, criando as condições perfeitas para sermos encantados pela maravilha que as MaidaVale trouxeram às Cartaxo Sessions.
Começo a ficar sem formas de agradecer à malta das Cartaxo Sessions por cuidarem tão bem dos nossos ouvidos e das nossas mentes! Como tal, proponho que sigamos sem mais preâmbulos e rodeios para o Centro Cultural do Cartaxo em mais uma chuvosa sexta à noite!
Por mais que tente, nunca conseguirei ser tão direto quanto os Spin the Skull. Apesar de já os ter apanhado no Vortex há pouco mais de um ano, o poder sónico do trio de Leiria voltou a deixar-me de queixo caído e pelos eriçados. Arrisco mesmo a escrever que, desta vez, à custa de um PA poderosíssimo, o impacto ainda terá sido maior. As malhas dos Spin the Skull serão o equivalente auditivo de uma lata de Red Bull bebida num só trago! À medida que os músculos, dos pés ao pescoço, vão ganhando dimensões popeyescas, a cabeça vai-se despoluindo de preocupações e pensamentos inúteis com uma eficiência tal que faria inveja a qualquer jato de limpeza miraculoso anunciado nas madrugadas de TV.
Punk, Metal, Heavy Rock misturados em doses incertas e, muito sinceramente, difíceis de decifrar, propagam-se de forma mágica e eletrizante … e, de repente, imagino-me no início dos 80, numa garagem suja, algures na California, a ouvir 4 miúdos borbulhentos a tocar o Kill’em All pela primeira vez. Sim, eu sei que terei as referências erradas, e que o som não será propriamente o mesmo … mas o meu feeling é esse e desafio-vos a contrariá-lo!
Cabeça limpa e corpo energizado! Condições mais do que perfeitas para aproveitar a delícia de concerto com que as MaidaVale nos presentearam. Em 2024, o quarteto de Estocolmo editou o seu terceiro longa duração, Sun Dog, um belo exercício moderno de psych rock enriquecido com tradições musicais tão diversas como o krautrock, o post punk ou o blues rock do deserto. Já este ano, as MaidaVale lançaram o single “Perplexity”, até então apenas presente na edição em vinil do álbum, e atestaram a carrinha para uma extensa digressão europeia que felizmente desaguou no nosso país, com datas em Aveiro, Guimarães e Cartaxo, reforçando a minha percepção crescente de que as propostas musicais mais interessantes tendem a chegar-nos pelos circuitos marginais.
Não sei se terá sido por ironia ou por humildade – simplesmente, não acredito que tenha sido por acaso – que a banda tenha escolhido o tema “Give me your attention” para iniciar a sua atuação, mas, na verdade, nem foi preciso que Matilda Roth chegasse ao refrão para que o público estivesse já todo vidrado no que se passava em palco e ecoava pelo muito bem preenchido Centro Cultural do Cartaxo. O belíssimo leak da guitarra de Sofia Ström já tinha feito esse trabalho. Em “Control”, o encantamento da audiência espalhou-se aos corpos, à conta dos ritmos dançantes propulsionados pela bateria de Johanna Hansson e pelas linhas linhas de baixo groovie as fuck de Linn Johannesson. A diversidade e a riqueza de tons com que a banda impregna o seu psych rock é um dos aspetos que mais me vai cativando no seu som e, para prová-lo, seguem-se texturas e ritmos do Saara em “Wide smile, all is fine” e a bonita e calma “Pretty Places”, em que os arpejos de guitarra insistem em tingir a canção de sonoridades próximas do indie britânico.
Tal como “Wide smile, all is fine”, temas como “Faces”, “Fools” ou “Daybreak” privilegiam os ritmos solarengos e coloridos do psicadelismo do deserto, Matilda Roth vai alternando a (segunda) guitarra, com o sintetizador e, sobretudo, com instrumentos rítmicos como a pandeireta. Há um sentimento dançante no ar que vai contagiando o público! Matilda vai ainda alternando o poder e o timbre do seu registo vocal, transportando-me por vezes, até à atmosfera dos seus congéneres Goat.
Num alinhamento naturalmente dominado por temas de Sun Dog, onde ainda houve lugar para o escuro e belíssimo “Perplexity”, as MaidaVale foram regatar três gemas de Madness is too pure (2018): o épico “Späktrum” com um staccato delicioso, o frenético “Trance”, que faz jus ao nome, e o orgasmo psicadélico de “Gold Mind” com que fecharam o concerto. Que noite perfeita!























