Foram eles a dar o fecho apoteótico a quatro dias intensos de música e memórias – os Franz Ferdinand transformaram a despedida de Coura 2025 numa celebração contagiante, deixando no ar a promessa de que o festival voltará em 2026 com a mesma energia inesgotável.
Aquilo que mais temíamos aconteceu: chegámos ao quarto e último dia do Vodafone Paredes de Coura. Ao fim de quatro dias, as pernas já fraquejam, a voz começa a falhar, as sapatilhas (porque estamos no Minho, não são ténis!) tornam-se irreconhecíveis… mas mesmo assim os olhos ficam molhados quando pensamos que, amanhã ao acordar, vão faltar cerca de 365 dias para a edição de 2026.
Os primeiros a subir ao palco foram os Cassete Pirata, que levaram uma pequena multidão ao palco secundário. Com uma enorme mensagem a apelar ao fim do genocídio, a banda portuguesa começou de forma discreta, mas com “Ferro e Brasa” os ânimos aqueceram e os sucessos foram-se sucedendo. E foi assim até ao final: ora com pulos infinitos, ora num singalong perfeito. O público dos Cassete é dos melhores de Portugal. Só espero que João Carvalho não tenha ouvido o Pir a chamar Paredes a Coura…
Ana Frango Elétrico trouxe o seu groove para a abertura do palco principal. “Vocês são foda”, disse numa das primeiras interações com o público, que bravamente resistia ao sol para a ver. Vieram canções novas, mas também aquelas que tanto queríamos ouvir: “Boy of Stranger Things”, “Insista em Mim”, “Nuvem Vermelha” e “Chocolate”. No final chegou “Electric Fish”, e todos sorriam e dançavam. A envolvência da música era tanta que, mesmo depois do concerto terminar e já com Chastity Belt a tocar no palco Bacardi, ninguém arredava pé, cantando em loop “pa pa pa ra ra”. As boas vibrações de Ana Frango Elétrico deixaram-nos de serotonina e dopamina no máximo, e com vontade de ouvir tudo outra vez.
Os nova-iorquinos DIIV já não são desconhecidos do público português, e voltaram a Coura. Com projeções de imagens e vídeos a acompanhar a sua música dream pop/shoegaze, de harmonias simples, mas texturadas, a performance tornou-se imersiva. A sonoridade da banda transporta-nos para décadas passadas. O meu ouvido tosco lembrou-se muitas vezes dos Deftones e, às vezes, até dos Nirvana, embora os entendidos digam que o som está mais próximo de My Bloody Valentine. Não digo que não. Foi um concerto agradável, mas olhando em retrospetiva acabou abafado pelos que se seguiram. É que shoegaze ao sol nem sempre resulta.
As nuestras hermanas Hinds entraram em palco descontraídas, esforçando-se no portunhol. Com ar de girl band do indie rock e garage pop, até com direito a coreografia, Carlotta Cosials e Ana Perrote deram tudo ao público minhoto. Quando tocaram “Boom, Boom, Back”, nem sentimos falta de Beck. As madrilenas recordaram, emocionadas, o dia em que vieram a Coura entregar um disco delas, com apenas duas canções, aos Black Lips. Moral da história: se há 10 anos estavas na front row, hoje podes estar em palco. Nada é impossível, ponham os olhos nas Hinds.

Tenho de confessar: tenho um fraquinho por mulheres de força no rock, seja indie, pop ou punk. Este festival trouxe várias, mas Sharon Van Etten é um dos meus girl crush. Com uma voz absolutamente incrível, ao piano ou na guitarra, a artista arrasou. Quando o rock dava lugar aos sintetizadores, Sharon desprendia-se dos instrumentos e dançava pelo palco de forma quase hipnotizante. A sua banda, The Attachment Theory, foi o suporte perfeito, dando intensidade e emoção crua às canções. Sharon elogiou o espaço e o público: não há como a maneira portuguesa de receber. Houve quem dissesse que o concerto foi morno. Como diria a minha mãe: “Perdoai-os, Senhor, que não sabem o que dizem.”

Já com a lua no céu, e algumas gotas que chuva a abençoar os festivaleiros, aparecia a banda francesa Air, um dos cabeça de cartaz do último dia do festival, e até de todo o cartaz. Apesar do Altamont ser enorme fã dos Air, quem assina este texto não partilha a mesma paixão e nem é apreciadora de concertos de música eletrónica. Mas mesmo assim, apesar de sentir falta de poder cantar mais do que as palavras “Sexy Boy”, o concerto foi uma experiência sensorial muito positiva. Entre o ambiente cinematográfico, a troca de posições quase coreografada e um alinhamento que não deixou de fora faixas icónicas como “Kelly Watch the Stars”, “Don’t Be Light” e “High School Lover”, Nicolas Godin e Jean-Benoît Dunckel mostraram-se mais técnicos do que emotivos. Ainda assim, foi um concerto irrepreensível e sofisticado, que convenceu fãs e até cépticos, eu incluída.

E chegou o ponto alto da noite, e de todo o festival. Uma das bandas mais icónicas do indie rock upbeat, os Franz Ferdinand, subiram a palco para “partir tudo”. Quando se tem uma carreira brilhante como a deles, é fácil manter um concerto de alta intensidade durante mais de uma hora. A escolha de “Matinée” para abrir as hostilidades já mostrava o que vinha aí: momentos inesquecíveis. Soaram “Take Me Out”, “Do You Want To”, “This Fire”… Houve concertos em que, meia hora depois de começarem, parecia que tinham passado apenas cinco minutos. Com os FF, era o contrário: depois de três canções, já tinham passado 30 minutos, tão rápido corre o tempo quando vivemos o inesquecível. Um rock vibrante, ritmos contagiantes e guitarras cheias de energia marcaram o concerto dos escoceses. O vocalista mostrou estar em grande forma, com a mesma presença carismática e voz marcante de sempre. Incansável na interação com o público, só conseguia repetir uma sequência de “obrigados” e elogiar a energia que enchia o anfiteatro natural. Os Franz Ferdinand são “the ultimate festival band”. Os seus concertos ficam gravados tanto na memória dos fãs como na da própria banda. Bob Hardy, de certeza, não se vai esquecer do mega “happy birthday” que lhe cantaram. Um final apoteótico que lembrou a todos porque Paredes de Coura continua a ser o festival dos festivais.
Quando os Franz Ferdinand se recolheram, passou diante de nós um verdadeiro recap das 96 horas de festival — e que momentos! O Vodafone Paredes de Coura, que contou com mais de 120 mil entradas, entre o recinto e o Sobe à Vila, regressa em 2026, de 12 a 15 de agosto. Esta minha primeira experiência em Coura foi inesquecível. Voltarei de certeza, assim como o Altamont. Já tenho saudades do pó.
Fotografias: Jorge Resende





































































